4.14.2016

O que terá acontecido a esta mãe?

Foi isso que esteve na minha cabeça durante os 10 minutos da viagem de comboio. Não é muito tempo, mas intrigou-me ao ponto de não ter vergonha nenhuma e de ter ficado especada a olhar para este homem e para esta bebé. 

Eu, que geralmente não largo o telemóvel, borrifei-me para ele. Estava perante todo um Louvre, um momento que merecia uma contemplação inegável. O que terá acontecido a esta mãe?



Vi um pai. Um homem muito parecido com o Xzibit mas de olhos claros. Tinha em si o ar mais másculo do mundo, como se só com um braço conseguisse amochar uma multidão, mas a transmitir a doçura de uma sobremesa com culpa à mistura. 

Ele era doce. Tinha a sua filha de um ano e meio (não mais) ao colo - estavam em pé no comboio. Ambos equipados para o frio. O pai de gorro e de quispo, a filha com um gorro em forma de urso, um quispo e duas calças. Não levavam carrinho. Ela estava ao colo dele. Com toda a força que o pai tinha, agarrava-a só com um braço. Sentiu-a cansada e, com a outra mão, encostou-a ao peito e sussurou-lhe algo, sonhei que disse: "descansa, bebé, descansa um bocadinho". 

A bebé, silenciosa, encostou a cabeça ao peitinho do seu pai e começou a fechar os olhos. Transmitiu-me aquela sensação que temos quando chegamos a casa depois de umas férias grandes: "cheguei, é aqui que pertenço". 

Segundos depois a bebé espirra e lança imenso ranho para cima da cara do seu pai e dela mesma. O pai sorri carinhosamente e, ainda com ela ao colo, procura calmamente um lenço no bolso do seu quispo. Limpou. 

Voltaram a ser um só durante mais uns minutos. 

Estavam só os dois. Dois que pareciam um. Um um tão bonito que senti que podia tirar pedaços da imagem com os meus olhos. Vi um monumento de amor. 

O que terá acontecido a esta mãe?

Se calhar nada. 

Aconteça o que tenha acontecido - se é que aconteceu alguma coisa - está bem entregue. Muito bem. Este homem só poderá ser amado por uma mulher igualmente bela e uma criança, filha de dois pais assim, tem só amor pela frente. 

34 comentários:

  1. A esse Pai se chama "PAI"!
    Provavelmente a Mãe já estaria a trabalhar há umas horas e para poderem deixar a bebé dormir mais um pouco é o Pai que a leva para a creche!
    É louvável ver crianças amadas desse modo!
    Adoro!
    O meu Pai era isso e muito mais! E tive a sorte de ter um Marido assim, também!

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  2. Céus Joana, dizias que o post desta manhã da JPB é que era tocante mas este é que me tocou mesmo.
    Será que realmente aconteceu algo a essa mãe?! Se aconteceu o pai parece ser pai e mãe na perfeição, se não aconteceu ainda bem, porque devem ser uma família linda.

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  3. Raquel J.4:08 da tarde

    Ohh Joana.. Essa observação nem parece de uma miúda de 30 anos! :) Porque raio é que supões que deve ter acontecido alguma coisa a essa mãe? Um pai não pode sair de casa sozinho com uma filha?

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    1. Exactamente! Que preconceito... este senhor só mereceu esta atenção toda e um post dedicado a ele porque era um pai (homem) sozinho com a sua filha... se fosse uma mãe (mulher) sozinha com uma criança (como tantas e tantas vezes se vê) já não perguntava onde estava o pai, pois não? Nem viria aqui escrever um post, certo? Achava normal, quotidiano, passava sem olhar 2 vezes e concentrava-se no telemóvel, como sempre.

      Não percebo o choque e a glorificação que ainda se faz hoje dos pais que cumprem com as suas responsabilidades e cuidam dos filhos. O meu namorado faz tudo o que eu faço relativamente à nossa filha e também às tarefas domésticas... wow... que sortuda sou eu! Que achado de homem! Que pérola tenho em casa :P que pai extremoso, um "paizão"! Sim, claro que é, tenho sorte e ele é fantástico, mas eu também o sou e, na verdade, limitamo-nos a fazer ambos tudo o que escolhemos juntos fazer e que o nosso projecto de vida comum acarreta.

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    2. Tb pensei o mesmo, confesso. Mas depois tb pensei que a verdade é que podemos apregoar que os pais conseguem tanto como as mães, que já não se usa essa ideia de que os pais não ficam à margem.. MAS... A verdade é que continuamos a ver muito mais maes do que pais a cuidar as crianças. Sem sombra de dúvida. Tenho para mim que além da questão cultural (que ainda é forte), há também a questão biológica. Acho mesmo que há uma ligação muito especial e forte entre uma mãe e um bebe. Mesmo quando há um pai igualmente carinhoso.

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    3. Concordo em pleno com estes comentários. Continuo a não perceber como é que em 2016 se vê um gesto de carinho e cumplicidade de um pai para uma filha e só se pensa na mãe. Esperava mais.

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    4. Idem. O que é que interessa onde está a mãe, se nunca interessa onde está o pai, quando é a mãe a carregar a filha ao colo, a limpar ranhos, a dar mimo? Enquanto não pararmos de glorificar o que deve ser visto com normalidade, a igualdade continuará a ser uma miragem.

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  4. Se calhar nada mesmo Joana, vamos acreditar que sim... Até porque podes encontrar o meu marido com o meu filho em preparos semelhantes todos os dias! Quis a vida que eu tivesse que ir trabalhar, e em horário 8H mesmo não tendo o meu filho 1 ano! Todos os dias é o Pai que o veste, leva À escola, vai buscá-lo e ainda lhe dá jantar sem que eu consiga chegar a casa. E é como descreveste este homem que o imagino todos os dias. Calmo, controlado, terno e carinhoso. Vou todos os dias trabalhar de coração apertado porque dói sempre, mas vou tranquila e segura que o meu filho está no melhor colo do mundo! Esperemos que esta mãe esteja tão tranquila e feliz quanto eu!

    P.S. - Deste uma abada em textos lamechas à JPB! Joana Gama: 1 - Betinha: 0 (tou a brincar....a betinha já te leva uns 10.000 de avanço :P )

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  5. O meu homem sai com a cria sem mim, a mãe se calhar estava a trabalhar xD

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  6. Joana,

    O texto está muito bonito e leva-nos até ao nosso imaginário mas, sinceramente, só me interrogo porque é que pressupões que aconteceu alguma coisa à mãe? Houve mais qualquer coisa que te levou a pensar isso?

    Quero acreditar que deixas o teu marido sair de casa sozinho com a tua filha...

    Juro que não é uma critica. Beijinhos! :))

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  7. Sem querer ser critica: é normalíssimo um pai sair só c a/o/os filhos...o meu marido sai imenso com as minhas filhas sem eu estar, é saudável e tão natural como sair eu c elas...

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  8. Das coisas mais bonitas que escreveste... Like!

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  9. Mas porque haveria de ter acontecido alguma coisa à mãe? Também faz a mesma pergunta quando vê uma criança ser cuidada pela mãe?

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  10. Adoro o vosso blogue, mas não consegui deixar de me sentir triste com este post. Uma mulher jovem, bonita e cheia de piada e, no entanto, na questão da paridade de género, parece me (posso estar errada) ainda tão cheia de preconceitos e ideias feitas. O meu namorado é felizmente os homens que me rodeiam fazem o mesmo que as mães relativamente às crianças e tem gosto e vontade em sair com os filhos, seja para tarefas, seja por prazer... Pensava que isto já era s regra em mulheres da nossa idade...
    Beijinhos

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  11. Que parvoíce de post, a sério. Há 2 e 3 anos estive a trabalhar longe de casa. Só vinha ao fim de semana. Com quem ficou a minha filha? Com o pai dela, como é óbvio.
    Agora com dois filhos, quem é que trata deles de manhã e os leva à escola e à creche? Obviamente, o pai das crianças, já que se fosse eu teria que os deixar às 7.30 e assim basta irem às 9.00.
    Vives em que século mesmo?

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  12. Depois ja vos respondo com mais tempo. Entendo o que dizem e acho que têm razão ao ter interpretado assim. Eu assisti a um momento que me tocou muito e senti sinceramente que aquela familia era só de dois. Era uma cumplicidade magica, como se, de fundo, se ouvisse uma musica triste mas que os fazia ficarem casa vez mais derretidos um no outro. O meu imaginario levou-me para uma cena mais triste. Talvez tenha de vos remeter para a minha terapeuta e de ligar ao meu pai a dizer que tenho saudades dele 😊 obrigada pelos vossos comentarios. Nao queria de todo dar a entender que os homens nao devem ter as mesmas responsabilidades e deleites mas sim de vos tentar passar aquela alegria que,de tao bela, para mim, ficou triste. Sei que será da minha cabeca,dai ter feito a ressalva. Nao queria ofender o nosso genero 😊 vou porem aproveitar para fazer uma revisao aos meus valores nesta questão porque vejo que sao todas mais modernacas que eu e gostava de ser mais como voces!

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    1. Ahahahahahahahah já ganhaste com o gostava de ser mais como vocês! JG: 1 - haters: 0!
      É assim mesmo :) uma pessoa já não pode partilhar a primeira coisa que lhe vem à cabeça que somos logo do século passado!
      You rock ;)

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    2. eu cá percebi. há cuidar e cuidar, há colos e colos. e tb já me aconteceu ver esse cuidar/colo "diferente" entre mãe e filho. há momentos em que vemos/sentimos que algo diferente está à nossa frente, algo dorido, sofrido, mesmo que lindo e cheio de amor. já senti o mesmo que sentiste ao ver uma mãe com dois filhos pequenos (2 anos e 4 anos), completamente sozinha, num aeroporto e depois no avião. ela tentava lidar com a birra do mais pequeno, que se debatia no colo dela, cheio de sono mas sem conseguir dormir. a mais crescida fazia por não atrapalhar. senti muita admiração por aquela mãe, que sozinha transportava dois filhos pequenos, e malas e bagagens, e brinquedos.. e também senti que faltava ali alguém, mas que era um alguém que faltava sempre. não era só uma família cujo pai por acaso não estava. era uma família cujo pai não existia. não faço ideia se interpretei mal, mas foi o que senti. e a tua descrição para mim foi isso. perguntaste onde estaria a mãe porque o que viste/sentiste foi que ela não existia, não foi apenas que ela não estava ali. não tem nada a ver com os pais poderem ou não cuidar das crianças tão bem como as mães.. pelo menos para mim o que escreveste não teve nada a ver com isso :) e o que escreveste foi lindo, foi sincero, foi "além" do que aparenta.

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    3. Oh anónimo das 9.17, século passado sim. Se fosse a minha avó a fazer esta pergunta eu até entendia, uma pessoa da idade da Joana, lamento, mas não percebo.
      São tão pra frente numas coisas, mas nas que realmente interessa, é o que se lê.

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    4. Percebi perfeitamente o post.. Há imagens que nos tocam e de alguma maneira nos fazem pensar em coisas tristes..no meio de coisas lindas! Não concordo nada com as críticas negativas, pois não encarei que tivesse o que quer que fosse de preconceituoso .Além do que, nem todos vivemos na mesma realidade e não vimos as coisas da mesma maneira, enfim :-) adorei o post, sempre interessante!!

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    5. Há alguma razão para teres essa separação de papéis tão firme na tua cabeça? Sem ironia gostava mesmo de perceber. Não acho uma ideia muito normal (no sentido de habitual/frequente) numa pessoa da tua idade. Eu tenho 3 filhos, uns 10 anos a mais e tenho várias amigas com vidas profissionais ativas e que o pai é que é o principal cuidador. Inclusive o meu filho tem um amigo da mesma idade (4 anos) cujo o pai desistiu de trabalhar para ficar em casa com os filhos. Num meio urbano acho essas coisas muito mais frequentes e normalizadas que há uns anos daí a minha dúvida com as tuas observações. Mafalda

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    6. Olá Joana, não fomos nós que "interpretamos assim"... foi o título que tu escolheste para o post e também a forma como voltaste a colocar a questão no final. Foste tu que deste a interpretação errada (ou não...) ao momento e que condicionaste o leitor. Podias ter simplesmente escrito o mesmo sem perguntar onde está a mãe. A mãe está na vida dela (assim esperamos) e o pai está a ser pai e a ter tempo de filha com pai... just that. Sim sim, eles sabem mudar fraldas e limpar ranhos e rabos... assim as mães os deixem.

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    7. esclarecida, obrigada!

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    8. Oh anónimo das 13:16, credo! Eu percebo o teu ponto de vista, mas (bolas!) que mania /tendência tem os portugueses de ir buscar dramatismo e procurar o que está errado em tudo! Até num simples desabafo sobre o sentimento que foi transmitido.
      Em vez de criticar a 'mentalidade' da Joana porque não se encarregaram e perguntar o porquê de ter sentido Q havia ali falta de uma mãe?! De facto, da mais trabalho e é mt mais fácil criticar!

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  13. Viste um pai. :D Num dia bom.
    Bem... vocês devem estar num concurso de fazer chorar as pedras da calçada... Imagino o que sentiste.


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  14. Até nem pode ser o pai...pode ser o irmão, o tio, o padrinho, um amigo da família... O que importa não é a filiação mas sim o gesto e foi isso que a Joana quis transmitir e eu assim o entendi... O amor maior...o de uma criança...

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  15. Sinceramente não sei o porque do espanto de a Joana ter pensado "o que terá acontecido à mãe"... Se fosse eu se calhar também teria pensado o mesmo!?! Digam o que disserem, é verdade que se vê mt mais as mães a tratar dos filhos que os pais... Embora, actualmente os pais também cuidem mais dos filhos do que à uns anos a atrás. E esta ternura que a Joana descreveu entre os dois, dá a entender que eles os dois passam mt tempo juntos.

    A mim, o que me espanta mais é as pessoas terem visto um homem com uma criança pequena ao colo e ninguém ter oferecido o lugar (se é que estavam todos ocupados).

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    1. Também concordo com esta opinião.
      Estamos em tempos que realmente os pais fazem muito mais tarefas relacionadas com os filhos, do que em gerações anteriores, no entanto, basta ver pelas creches/ escolas, a percentagem de mães que vão levar ou buscar as crianças é muito superior à percentagem de pais. Eu diria talvez uns 85% vs 15%...
      No lugar da Joana secalhar também eu teria pensado o mesmo, e ainda por cima depois de ler o comentário dela aqui mais acima...

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  16. Que descrição tão doce e delicada... Felizmente não damos sempre ou somente conta das coisas más... há quem veja estas coisinhas boas que nos "aquecem" o coração e nos fazem acreditar que o BOM, BELO existe :)
    Beijinhos!

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  17. Não fiquei espantada. Não há muito tempo atrás, a Joana escreveu um post onde assumiu de forma bem transparente que ela é o pai da Irene têm papeis bem diferentes na vida dela e como a Joana puxou para si toda a responsabilidade da parentalidade. A Joana poderá voltar a pôr aqui o link caso queiram reler. Assim, não me espanta o post (por esse lado) e até entendo que a Joana se tenha enternecido (eu também me enternece com a cumplicidade entre adultos e crianças, seja esse adulto quem for). De tudo isto fiquei contente com o comentário da Joana (caso não seja irónico) pois acredito que esteja a fazer um esforçar por tornar a Irene mais de mundo e menos sua. Um beijinho
    Ângela.

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    1. Concordo com este comentário e lembro-me desse post! Surpreendeu-me porque a JG dá ar de ser toda modernaça, é nova, gira, tem piada, parece descontraída e à vontade... mas depois no que toca à vida de casal e filhos demonstra ser um bocado conservadora e preconceituosa!

      Já a JPB, que é supostamente a "beta", a da vida muito certinha, a conservadora... demonstra ser mais flexível e moderna no que toca ao casal e filhos.

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  18. Adorei o texto, Joana. Lavaste-me a ver um filme... foi uma sobremesa deliciosa... Não há nada mais mágico que o amor.

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  19. E se eu estiver só com o meu filho também questionará pelo Pai?

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