"Vou escrever sobre
o terror do meu parto!!!!
Hummm
É tão negativo e isto (a
maternidade, leia-se) até é uma coisa bem fixe."
...
"Vou escrever sobre
os primeiros meses!!!!!
Fraldas. Biberões. Choros
indecifráveis. Entreter bebé que não dá feedback. Hormonas ainda meio loucas e
deprimidas.
BOOOOOOOORIIIIIING!"
...
"Vou mas'é ter
juízo, curtir o meu tempo livre a ver mais blogs e facebook (oh yeah!!!!!
Cultura para cima!!!!) com o terrorista a dormir e deixar de me sentir a
Shakespeare do momento."
Mas foi mais forte do que
eu!!!!
"Calmaaaaa! Vou
escrever sobre ter um filho em Angola!!!!"
Pois... é o caso!
Será suficientemente
interessante?
Por aqui vive-se sem luz
a maior parte dos dias, dependente do tanque de água, com medo das picadas dos
mosquitos e a rezar para que as diarreias (porque as há de tempos a tempos)
sejam ligeiras e pacíficas.
Então como é que é viver
em Angola com um bebé desde os 4 meses?
Vive-se...
A primeira vez que pus a
rede mosquiteira no meu filho fiquei em pânico. "Ai porque vai dormir mal!
Vai-se sentir preso! Vai acordar e berrar porque vai ficar assustado com a
rede!" Mimimimimi...
Nada. Pacífico.
Dormiu tranquilo. A rede
mantém-se. Já tem uns valentes buracos graças a um gatinho maravilhoso que
achou que era uma brincadeira gira, mas todos em lugares estrategicamente bem
colocados para poderem ser "tapados".
O repelente... esse
chateia-me um bocadinho porque a maior parte dos repelentes não faz
porcariazinha nenhuma. Aliás, estive mesmo para empregar a outra palavra pior
que porcariazinha, mas o vosso blog é tão mimoso que achei que não ia ficar
bem. Continuando...
Os repelentes que repelem
realmente os mosquitos dizem que é para maiores de 2 anos. Os outros... dá-me a
sensação que os mosquitos ainda se lambuzam depois da picada. O ideal? Não sair
com o puto depois das 17h. É! Não dá, não dá! Paciência. Mas tentamos manter
este horário à risca.
Claro que entretanto
tenho um artista que para além de saber fazer o som de não sei quantos animais
sabe como se afastam moscas e mosquitos. A seguir ao "Então como é que faz
a vaca?!" vem logo o "Então como é que se mata um mosquito?". É.
Qualquer criança que cresça em Angola sabe como se mata um mosquito. (palmada
no ar caso não saibam)
E qualquer criança que
cresça em Angola sabe como é que se dança. Mas dançar a sério. Não são esses
saltinhos e ondulações dos bebés normais. O meu filho levanta a perna e dança
kuduro na perfeição. "Não faz isso Bela, não faz isso Bela, não faz isso
B-B-B-Bela!" e é vê-lo a levantar a perna e a girar. Uma delícia.
E quando falta a luz?!
"Lú lú lú lú!" E lá trepa ele por mim acima só para ter mais uma
viagem ao quintal para ir ligar o gerador. E como é que se explica a uma
criança de 1 ano que o gerador às vezes avaria e não há mesmo luz? Nem
televisão? Nem Panda???!!!! Não conseguimos explicar. É escusado.
E a água? A água é um
problema porque não é potável. No meu caso instalei uns super mega filtros,
mas... a maior parte das pessoas não tem. Como é que fazem com bebés que adoram
beber toda a água do banho? Dão com água fervida. Ou água engarrafada. Ou...
Não. É mesmo só uma
destas opções.
Ou então já têm filhos
com estômagos de aço como o meu que no outro dia ligou a mangueira (sem água
filtrada) que estava apontadinha para ele e bebeu ali umas valentes litradas de
água cheia de bichinhos e girinos e porcariazinhas que rimam com cólera, mas
safou-se bem. Valente do miúdo que nem um cocó mole teve (sim, qualquer post de
maternidade deve ter a palavra cocó incluída! Desculpem lá!)
E vais passear com ele
onde?
Pois... é um problema.
Nós cá em casa não somos muito fãs de praia. E as escolhas são praia,
restaurantes, praia, esplanadas na praia, e.... ah, praia! Pois...
Havia um jardim
fantástico, com escorregas, árvores, casinhas de plástico, baloiços, carrinhos,
bicicletas, dava para todas as idades e tinha segurança. Sim pagava-se mas...
ok. Faz parte. Fechou. Fechou! Assim. De repente. Sem aviso. Sem backup.
Centenas de mães anti-praia ou fartinhas de praia sem opção.
Por aqui montámos uma
mini piscina no quintal comprada num hipermercado qualquer e olha... tem
resolvido o assunto "entretenimento" por uns tempos. Mas a piscina é
mesmo mini. E esta malta cresce muuuuuito. E rápido. Por isso, acho que as
Playstation vão ser uma opção aqui por estes lados.
Escola e cresches?
Tem e muitas. Mas caras!
Caríssimas!!!! Com preços de fazer corar.
Eu fui burra: pus-me a
pesquisar... a ver as fotos nos sites e no facebook, a apreciação de algumas
mães... e fui excluindo uns, pondo de lado outros... depois via o horário, o
tipo de ensino, as actividades extracurriculares... até que cheguei a 3: uma
que muita gente fala mal, uma que é de uma língua que ninguém fala aqui em casa
e outra que são 1800 dolares por mês.
Por isso este assunto tem
sido tabu nos últimos tempos pois põe-me valentemente mal disposta.
O que é que vou fazer?
Não sei. Ponto final!
E onde é que ele fica
durante o dia?
Com uma babá. Que é muito
comum por estes lados. O meu filho não tem avós cá. Tem uma babá a quem ele
trata por mã. Que é muito carinhosa. Que vem trabalhar sempre de sorriso na
cara. Mas que à primeira fralda que trocou quando o Gui tinha 4 meses se virou
para mim e disse "o Gui si cagó". E eu fiquei verde. Roxa. Rosa
flurescente. E depois voltei à minha cor amarelita normal e disse-lhe muito
calmamente "fez cocó... O Gui fez cocó".
E assim tem sido ao longo
deste ano e alguns meses: lutar contra o "si mijó", o "estou à
vi", "o Gui não querO", "o Gui si páncou" e coisas do
género. Mas sim... eu sei que mais cedo ou mais tarde, daquela boquinha fofinha
do meu bebé, há-de sair uma atrocidade qualquer destas. É a vida. Paciência.
Por outro lado tem a
vantagem de nunca ter posto um casaco mais quente do que um casaco de algodão
ao meu filho. Vivemos no calor e vamos de férias ver a família em época quente.
Se tudo correr bem neste próximo natal vai sentir o que é o frio. Calorento
como é acho que vai gostar.
E a saúde?
Bem... eu trabalho na
área da saúde. Tenho a vida facilitada e alguns conhecimentos. Mas quando ele
partiu a cabeça (sim, ele é um pequeno terror com duas pernas e dois braços!),
e nem houve discernimento para pensar a
quem telefonar ou onde ir, fomos parar a uma primeira clínica que... "Ah,
pois... aqui não damos pontos". Ok. Boa. Então e agora?
Lá fomos nós para uma
segunda clínica.
Depois de passar por 4
médicos e um enfermeiro lá decidiram passar à acção. E não havia recursos
materiais. Faltavam aqueles pensos que evitam dar pontos "Não
temos!". E só foram à procura daquela linha absorvível porque eu fiz uma
birra horrorosa a bater o pé que não voltava com o míudo para tirar pontos que
não me apanhavam ali tão cedo.
Mas é o calcanhar de
aquiles. A saúde. E depois ouvimos histórias... daquele e do outro que
"estavam bem", "vê lá, era só uma apendicite e morreu coitadinho
do pequenino", "não souberam ver que ele tinha uma sepsis"...
QUERO FUGIRRRRRRRR! Mas não... depois ficamos... benzemo-nos... pedimos que
seja só com os outros... e continuamos a nossa vida a pensar "quando
voltarmos A CASA vai ser tudo tão mais fácil!"
(será que isto já vai na
ordem do argumento do Benur?!...)
Depois tem coisas boas...
bem boas. Há mais união entre o grupo de amigos. Estamos mais presentes. Temos
mais tempo para saídas. Para lanches. Para conviverem as crianças todas. Há
mais apoio. Passamos todos pelo mesmo. Uns com mais experiência que outros. Mas
somos família. Família emprestada.
Voltar a casa vai ser
bom. Mas enquanto não voltamos vamos vivendo felizes.
Ana Feijão