“Tu és grande e gorda” disse a Luísa a uma menina com uns 8, 9 anos, que não estava a conseguir entrar numa casinha com escorrega. Ela respondeu, a olhar para mim: “vou ignorar a segunda parte”.
Não soube bem como reagir. Primeiro porque, para a Luísa, chamar alguém de gordo não tem qualquer tom pejorativo associado. Tem três anos e nunca me ouviu dizer (nem me parece que tenha acontecido no nosso núcleo, mas não posso pôr as mãos no fogo) que eu estava gorda ou magra ou a comentar o que quer que seja sobre alguém.
Mas, para ela, ser gordo é ser grande. O cão come muito e é gordo. O senhor é gordo. Aquele gato que não tem pelo, sabem?, é magro. A menina é gorda. A palavra, na boca dela, é neutra. E deveria ser assim sempre, não?
A menina não a sentiu assim, talvez habituada a lidar com essa palavra há muito tempo e com tom de crítica, certamente. Percebo. Deve ser duro.
Eu tentei remediar, no momento, mas nem sei o que deveria ter feito. Disse: “ela tem 3 anos, não sabe o que se deve ou não dizer. Ela também diz que é gorda quando come muito. E fica com barriga grande. Não foi por mal”. E ela respondeu: “sim, mas eu sou gorda.” E eu: “mas não há nada de mal eu ser-se gordo, és linda. (...) E muito simpática”. E era. De uma educação tremenda. Foi buscar os ténis das miúdas à areia para as ajudar. Um amorzinho de miúda. E ela continuou: “eu gostava de não ser tão gorda. Também não queria ser só ossos, mas gostava de ser ... ali no meio”. E eu disse: “então mas um dia vais conseguir”. E, depois pensei: mas se não conseguir e se for saudável, não faz mal. E disse “desde que haja saúde, o resto não tem importância. Sabes o que eu fazia aos miúdos que gozavam com os meus pés grandes? Nada, deixei de ouvir (e fiz o sinal de “não estou nem aí” com as mãos, deslizando os dedos, sabem?).”
Eu não estou apta para ter estas conversas com ninguém, muito menos com uma criança. Mas senti que não podia deixar de lhe responder. Só que... o quê? Primeiro, porque não sei se está a ser feito algum trabalho com ela numa psicóloga, numa nutricionista, não sei se tem algum problema de saúde associado, não faço a mais pálida ideia se eu ter dito que “não há problema nenhum em ser-se gordo” é precisamente o contrário do que lhe têm dito em consultas, imaginem. Depois, porque não estou informada sobre o assunto suficientemente. A nossa sociedade é gordofóbica e, por mais que eu possa querer afirmar que não sou, acho que também eu tenho alguns preconceitos, mesmo que lá no subconsciente. Como é óbvio, não discrimino, não escolho os amigos pelo peso, vejo beleza em diferentes tipos de corpos e de pessoas, mas ainda associo, principalmente em idades destas, em crianças e jovens, a obesidade (que, atenção, não faço ideia se é sequer o caso), a alguma falta de informação da família ou de acompanhamento. Nem sempre o será. Sei lá eu as causas. E daí eu dizer que não estou plenamente preparada para falar com uma miúda de 8, 9 anos sobre isto. Mas surgiu.
A minha questão agora é: aproveito este caso para explicar o quê às minhas filhas? Se digo à Luísa que não se chama gordo às pessoas, não vai entender e, às tantas, vai passar a chamar a todas as que vir na rua (tal como quando dizem uma asneira e nós damos demasiado ênfase àquilo). A Isabel até já pode ter entendimento para isto, mas, por exemplo, quando a Irene a imita a falar (a Isabel é “sopinha de massa”) não noto nada que fique triste. É uma característica dela e ela também não sentiu ainda nunca isso como algo com tom pejorativo. A Irene imita-a por achar essa característica diferenciadora e não é num tom jocoso. É porque a adora. É como se imitasse uma língua diferente. Ou um tom de voz bastante agudo. Percebem? Eles estão em idade de experimentar muita coisa, de serem teatreiros, não estão a ser bullies.
A Luísa não estava a querer ofender a miúda de 8 anos chamando-lhe gorda. Mas gostava muito que não repetisse, porque imagino que a miúda tenha ficado triste.
Explico-lhe numa próxima vez? O quê e como? Espero que tenha mais uns dois anos? Algum livro?
Obrigada!
Com 3 anos, acho que até pode usar esse exemplo para explicar. Dizer que chamar gordos aos outros os pode deixar tristes como deixou aquela menina que já estava triste por não conseguir ir para o escorrega. É verdade que a intenção da Luísa não é ofender mas também é verdade que poucas serão as situações em que chamar gordo a alguém não deixará esse alguém triste por isso se calhar mais vale explicar que não é uma palavra que se deva chamar aos outros.
ResponderEliminarEpa, não entendo assim. Ela estava a constatar um facto igual a ser anão, ser cego, ser loura, ser gigante... é uma característica, não a estava a chamar gorda. Se calhar temos é de parar de olhar para as palavras com uma carga negativa associada, não? Não sei, vou pensar mais nisto. Bom tema, Joana
EliminarEntão concordamos as duas: a ideia nunca passou por ofender, estava apenas a constatar um facto. Infelizmente, volto a frisar, serão poucas as situações em que constatar este facto em voz alta à frente das pessoas não as deixará tristes. Basta ver a reaçcão da menina: não houve má intenção da Luísa, mas a verdade é que deixou alguém triste, certo? Se eu dissesse à Joana antes da operação que tinha o peito descaído, por muito que fosse um facto, acharia que eu estava a ser desagradável, não? Ou se comentasse como os seus pés são grandes (nunca reparei, sou sincera, mas lembro-me de falar disso num vídeo).
EliminarEu concordo consigo que infelizmente as palavras têm uma carga negativa e não deveriam, mas quando estamos a falar de características de pessoas infelizmente as coisas ainda são assim (a Luísa nunca disse a nenhuma menina que era muito elegante, se calhar). Eu por exemplo ensino a minha filha que não se deve falar do corpo das pessoas, sem dizer que ser gorda, alta, anã, nariz grande é mau ou bom. Simplesmente não se fala do corpo dos outros da mesma forma que não se aponta directamente para ninguém. Ela também 3 anos, nem sempre acata mas é um trabalho a fazer. :) Até porque para mim é isso: mais do que tirar a carga negativa das palavras para as poder dizer em voz porque razão não deveríamos simplesmente não andar a apontar as características dos outros?
Concordo. No entanto, acho que só com várias experiências semelhantes se consegue passar a mensagem. Não vejo como se pode prevenir este tipo de comentários de uma criança de 3 anos. Se uma criança perguntar a alguém no nanismo se essa pessoa é uma criança ou um adulto, por exemplo - já aconteceu a uma amiga minha - (ou nos perguntar a nós falando mais alto), explicamos no momento e depois temos a conversa de seguida. Enquanto não acontecer, como explicar todas as formas físicas possíveis, todas as diferenças, para que em contacto com elas, as crianças não se sintam curiosas e não lhes saia espontaneamente algo? Acordo todos os dias de manhã a dizer "não se fala dos corpos dos outros"? Estou a usar uma hipérbole :) Enquanto a Isabel não se importar com o facto da Irene a imitar, explicamos à Irene que não se imita alguém (mesmo que não seja a gozar com essa pessoa?). Estamos a falar de uma característica física. Tenho muitas dúvidas :) Beijinhos e obrigada pelo contributo!
EliminarAtravés de histórias, por exemplo.
EliminarAlgum livro que recomende ou alguma história que ache que se adapte? Obrigada
EliminarLamento mas na minha opinião (que vale o que vale) a Luísa devia ter sido repreendida logo ali... É insultuoso o que ela disse, com ou sem intenção...
ResponderEliminarEu disse-lhe que isso não se diz, mas preocupei-me mais em falar com a menina, até porque me pareceu que ela queria mesmo falar sobre isso. Mas sim, na próxima, poderei focar-me mais em explicar à Luísa que isso deixa as outras pessoas tristes, que não se diz. Só tenho pena que fique com 3 anos a perceber que “gordo” é algo mau, que deixa as pessoas que são gordas tristes. Percebe o meu raciocínio? Ela é tão pura... enfim, não me consigo explicar melhor. 😁
EliminarRepreendida, calminha. Nem com violência nem com brutidade. Devia ser-lhe explicado que não se fala sobre os corpos ou características dos outros, vá, a não ser que seja para elogiar. Mas com 3 anos... uhm. Ela vai lá chegar, com outros momentos de confrontação com a diferença.
EliminarRepreendida?Que exagero!Insultuoso?A miúda tem 3 anos e para ela gordo ou magro é apenas uma característica.Se tivesse dito “és magra” também o consideraria insultuoso?
EliminarAna S.
Acho que a questão é explicar que não se aponta das características físicas das pessoas porque não é educado e podem não gostar. Ser magro é regra geral algo bom na nossa sociedade mas também acho que é de evitar referir. Para isso por exemplo é de evitar aquela conversa "estás tão magrinha que gira!"
ResponderEliminarO universo da Luísa não é só a família, também vai à escola onde convive com outras criancas e outros adultos, por isso essa palavra pode não ser assim tão inocente. Atenção!
ResponderEliminarAs pessoas estão-se a passar um bocadinho. Não releve Joana pff a usa filha vai, com os exemplos que tem em casa, percebendo com o tempo e com uma idade que o permita, que isso não se diz. E pronto. Esteve muito bem a responder à outra criança. Não faria melhor. Parabéns pelo discernimento e por se importar.
ResponderEliminarQuando a minha filha mais velha tinha 2 anos perguntou-me “o que é isto?” ao passarmos por um menino negro na rua. Felizmente acho que os pais e o menino não ouviram. Acho que fez a pergunta como a sabia fazer. Não conseguiu elaborar melhor para a idade que tinha e então saiu-lhe o “isto”.
ResponderEliminarAcho que nunca vamos estar preparados para tudo. É explicar no momento e falar com a pessoa em causa.
Acho que a Joana apesar de tudo o que não sabia esteve muito bem!
Penso que uma hipótese seria dizer à Luísa que apontar a alguém que não está a conseguir fazer algo (neste caso foi porque a menina era grande, noutro pode ser porque é pequena) pode deixar a outra pesssoa triste e isso não é bom... sem dar ênfase à característica enunciada, mas ao ato... Bem haja pwlo cuidado com a outra menina!
ResponderEliminarParece-me bem! Obrigada pela dica 😘
EliminarPassei por um dilema semelhante no ano passado, quando a minha filha tinha 3 anos também... Mas connosco a questão prendia-se com a cor da pele. Não podia cruzar - me com ninguém negro (preto, ou seja lá qual for o termo) que a Inês apontava e dizia que a pessoa era preta. Era horrível... De todas as vezes que isso acontecia, explicava-lhe que a cor da pele não interessava para nada e que as pessoas poderiam ficar tristes por ela as chamar assim (ela na verdade não as estava a chamar de "pretas", só estava a constatar que eram diferentes dela na cor da pele), mas não resultou... Sempre que passávamos por alguém "preto", ela apontava e dizia que era branco, só para a pessoa não ficar triste (juro que isto aconteceu). Aí as pessoas ficavam a olhar para mim sem saber se deveriam sentir-se ofendidas ou não... Depois de muitas conversas sobre sermos todos iguais, ainda por cima tendo uma das melhores amigas da escolinha mulatinha, começou a dizer:"aquele senhor é preto mas é lindo". Senti que estávamos a chegar a algum lado... E depois passou. A diferença deixou de lhe fazer confusão. São fases do caraças estas... Boa sorte!!!
ResponderEliminarJoana faz-me espécie essa tua afirmação de não estares para, etc....nem tudo vem num livro, e não há fórmulas, ok? És um ser humano e como ser humano, fizeste o teu melhor e focaste-te na miúda. Na minha opinião estiveste muito bem. Desdramatizar creio que é o melhor. Fico triste por saber (e sei) que há meninos que se sentem mal por serem gordinhos, por serem gozados, por uma sociedade que quer queiramos quer não, é muito cruel nesse sentido. Quanto à Luísa não te martirizes. Tem 3 anos. Coitadinha, ela está a aprender ainda a adjetivar o mundo e no fundo....se a outra menina era gordinha, não há mal nenhum nisso. Só há mal por ela se sentir mal, mas quantos de nós se sentem mal por ser assim ou assado, e outros nas mesmas circunstâncias, não se sentem da mesma forma? És uma boa alma. Tiveste uma excelente atitude.
ResponderEliminarFez-me lembrar o meu filhote que um dia disse com orgulho que era o mais gordo da turma (da pré) e que tinha sido a auxiliar a dizer-lhe isso, foi como uma facada no meu coração de mãe. Mas na verdade depois de puxar a história tinha sido usado como bom exemplo porque come bem,era "gordinho" terá dito a auxiliar em tom de bom exemplo, de que ers mais forte e os putros tinham que comer bem para serem iguais. Quando tentei contraria-lo dizendo que não era gordo (e não é, só é torneadinho e come efectivamente bem) insistia que não, que era gordo. Parei a conversa quando percebi que a palavra "gordo" para ele não tinha a conotação que eu lhe estava a dar, para ele era uma coisa boa, e deixei passar. Tinha 5 anos.
ResponderEliminarSou da opinião de dar a minha opinião só quando a pedem. Se a minha opinião não acescentar nada de valor à vida daquela pessoa prefiro ficar calada. É isso que ensino aos meus filhos. Não se trata de tirar carga negativa às palavras, trata-se em não realçar as características dos outros quando isso não interessa nada. É uma menina pequenina, vai ainda dizer muita coisa que sem querer vai ofender ou ter muita graça, mas acho que podemos já paassar-lhes esta mensagem: se não acrescentar nada de útil à vida de alguém, mais vale nem comentar. Bjinhos
ResponderEliminar👌 exatamente isso. "Contribuir ou contaminar"? Se contribuir positivamente para a vida da outra pessoa, tudo bem. Se contaminar, é preferível não dizer nada. E no que toca a características físicas, a probabilidade de contaminar é enorme.
EliminarEu lembro-me da minha mãe me ensinar isso! Acho até que há muitos adultos que não o sabem e deviam saber! :) mas para eu me lembrar, não tinha certamente 3 anos. 🤪 adaptando à linguagem dela, talvez possa dizer que só se diz coisas bonitas e simpáticas aos meninos e aos adultos. :) se bem que ela chateada com a irmã diz muitas vezes “és feia” e “não gosto de ti”, o que também me parece normal para uma miúda desta idade 😁 é a forma dela mostrar que está zangada. Ando a treinar com ela os sentimentos e tudo o mais. Empatia não lhe tem faltado, regra geral, mas o resto vem com o tempo, não é? :)
EliminarA minha mais velha já me fez passar algumas vergonhas. Relativamente à cor da pele quando era mais nova (expliquei que todos temos cores de pele diferentes e juntámos os braços de vários membros da família para ela ver q é verdade, e que por dentro é que somos todos iguais). Nunca mais falou disso. Mais recentemente tb andava com essa de chamar gordas às pessoas e apontar, expliquei duas vezes que isso não era bonito, que magoava as pessoas, e felizmente já se deixou disso. Há dias disse-lhe na brincadeira "anda cá, gorda boa" (coerência, right?!?! Ela é magra ainda por cima) e chamou-me logo à atenção, que não se chama gordo a ninguém.
ResponderEliminarOlá, Joana!
ResponderEliminarVou falar-te como mãe de um menino de 5 anos, efectivamente gordinho, que ainda há pouco me disse: "Mamã, hoje a X chamou-me gordo! Eu disse-lhe que não era gordo e para ela se calar, mas ela continuou...".
Ele ficou muito triste com a atitude da colega e eu fiquei sem saber o que lhe dizer para que, no futuro, se defendesse em situações do mesmo género.
Infelizmente, são situações que acontecem com relativa frequência e, acredita, também é muito complicado estar do lado de cá, talvez até mais, porque é a nós que cabe "segurar" a auto-estima destes miúdos, o que é extremamente difícil numa sociedade preconceituosa e maldizente como a nossa.
Felizmente, na situação que relataste, tiveste a oportunidade de falar com a menina, amenizando o que ela estivesse a sentir.
Relativamente à Luísa, acho que o caminho é mesmo explicar que as pessoas têm formas, "cores" e feitios diferentes e que está tudo bem com isso, não havendo necessidade de apontar essas diferenças.
Beijinhos
Obrigada e um beijinho 😘
EliminarJoana...
ResponderEliminarFico triste por saber que pensas assim...
Como sempre te vi, e sempre demonstras um grande conhecimento deste mundo que é o das crianças, nunca pensei que concluísses uma situação destas assim.
É um jogo perigoso... é insultuoso...
Ninguém nasce racista, preconceituoso, etc...
O teu meio familiar não é o único que a Luísa conhece, aliás em termos de horas, provavelmente em casa é onde passa menos tempo.
As crianças, tal como tu sempre defendes, tem o seu próprio ritmo de aprendizagem, mas muitas vezes na escola e no seu próprio círculo social, de amizades, é incutido este tipo de “comentários” pelos pares.
Não podes admitir que a tua filha com 3 anos diga que outra é gorda (mesmo que obviamente para ela não foi uma “ofensa”), porque depois não vais poder impedi-la de com 16 fazer pior... percebes...
Tu ao não explicares, ao não falares sobre o assunto é que vais como que “dar permissão” para que ela diga as coisas de maneira errada.
Hoje em dia, existe uma taxa muito elevada de crianças que andam em psicólogas, em terapias, com desvios de auto estima...
e sim vindo maioritariamente de CRIANÇAS PARA CRIANÇAS.... (isto até nos poderia levar a outro assunto que são os valores e aquilo que ouvem em casa)!
É assustador os pais não repreenderem os filhos, e depois mais tarde ficarem surpresos com determinadas atitudes.
A minha filha, com hoje 13 anos, sabe muito bem como falar e tratar qualquer pessoa que não seja como ela, independentemente de isso não ser “por mal”. Sabes porque Joana? Porque aquilo que a minha filha diz pode até não ser por mal, mas é egoísmo puro pensarmos apenas que a nossa filha é uma coitadinha que não sabe o que diz, e permitirmos que a outra pessoa sofra, sim SOFRA, por o comentário da tua filha se juntar aos outros 1000 que a pessoa em causa já ouvi-o.
Não é só porque não é um problema em que não estamos familiarizados, que vamos deixar passar em branco.
Procurar saber pelos nossos filhos, sim, mas também como eles devem se comportar em sociedade, para que outras pessoas não sejam atingidas com o nosso egoísmo.
Bem, em primeiro lugar, fico triste que fique triste (Eheh) ou desiludida mas não consigo agradar a toda a gente, aliás já desisti há muito tempo.
EliminarTenho pena que compare o entendimento de uma criança de 13 anos com uma de 3 acabados de fazer.
Como é óbvio, eu não conseguiria admitir que uma filha minha com 13 anos tivesse declarações iguais a estas. Teria de ir com ela a uma terapeuta tentar descortinar frases semelhantes, preconceitos ou medos, caso eu não fosse capaz de o fazer e de a ajudar. Sim, porque eu acho que até alguém com um comportamento bully precisa de ser ajudado. Mas bem, são outras andanças.
Neste caso, estamos a falar de uma criança que mal sabe o significado de algumas palavras, quando mais. Uma criança que diz “ontem” quando quer dizer “amanhã”, que está a treinar antónimos e até a desenvolver agora confiança para falar com pessoas e expressar-se. Estar a enfiar exigências e expectativas semelhantes no mesmo saco, parece-me extremado. Tal como não relevei quando a minha filha desatou a chorar com 7 meses num hospital com uma médica angolana: não via televisão e não temos nenhum amigo próximo que fosse lá a casa que não fosse branco. Foi a reação possível numa bebé doente perante a diferença. Não me pareceu que fosse o momento indicado para lhe explicar, naquele contexto, que os corpos são diferentes mas somos todos iguais e que pode confiar. O meu trabalho naquele momento foi acalmá-lá, dar-lhe segurança e dizer-lhe que “é amiga”. Já sabia que, mais tarde essa “estranheza” passaria. Passou, claro e hoje, por exemplo, a Irma, da escola, é a “tia” dela.
O que lhe quero dizer com isto é que... tudo a seu tempo. Nem tudo tem o tom que nós, adultos, atribuímos. Naquele momento disse-lhe que aquilo não se dizia e a partir de agora vamos tentando encontrar outros exemplos, quer em livros (enviaram-me um girissimo chamado orelhas de borboleta), e até o Elmer dá, para trabalhar isso, quer na vida, prática, ou em desenhos. Mas sem histerismos! Sem acusações de “egoísmos” e coisas que tal, ok? Boa noite!
E, só para acrescentar, eu não deixei em branco, tanto que fiz este post, de forma humilde, a pedir opiniões e a ajuda - mas coisas práticas, não acusações de “egoísmo” - sim, não gostei que usasse essa expressão várias vezes. Ainda bem que recebi dicas de livros e até de outras histórias em que a curiosidade das crianças e a sua espontaneidade as levou a dizerem coisas que nos envergonham ou deixam desconfortáveis, mas para as quais queremos encontrar uma solução. E não, não é por uma criança se ter espantado com a minha cara com borbulhas (e que hoje é um adulto sensível e equilibrado) que isso faz dela uma egoista (ou os pais) - somos seres humanos, temos falhas e momentos em que não conseguimos disfarçar curiosidade, espanto, etc. Acontece, ainda para mais sendo... crianças :)
EliminarQue exagero!!!! Eu acho que tiveste lindamente. 3 anos!!!! 3 anos é uma idade para os deixar serem livres. A única ali com resposabilidade para remediar a situaçáo eras tu, e fizeste-o ao falar com a criança mais velha, criança essa que não se sente bem em estar gordinha não pelo que a Luísa disse, mas sim pela sociedade.
EliminarA Luísa é pura ainda, acho mesmo cedo falar sobre o que pode ou não dizer.... Se perdermos a sinceridade das crianças, este mundo tá perdido! Ela tanto a chama de gorda como no segundo seguinte lhe da um abraço e beijihos, não a exclui de maneira nenhuma por caracteristicas fisicas. E isso não é importante?? É porque às tantas ao explicar o que não pode ser dito até a pode afastar de pessoas diferentes. Não concordo nada com esta anónima. ZERO. Não se pode comparar de maneira nenhuma um bebe de 3 anos com uma criança de 13.
Absolutamente de acordo. É um trabalho que se faz diariamente, habituarmo-nos e habituarmos os nossos filhos a não comentarem sobre o corpo das outras pessoas. É algo que pode deixar marcas muito profundas.
ResponderEliminarConcordo! Mas acho que se faz com momentos em que isso ocorra ou com histórias sobre o assunto. Não estou a ver formas criativas de explicar isso sem um contexto, sem uma premissa.
EliminarEu teria repreendido a Luísa na altura. Chegando a casa iria explicar que as pessoas são todas diferentes, gordas, magras, altas, baixas.... não me focando apenas na gordura.. mas dando muitos mais exemplos. Diria também que quando se vê alguém diferente não se comenta na frente na pessoa... se tem alguma dúvida, pergunta ao adulto (ex: cadeira de rodas, falta de algum membro..) pois a pessoa em questão pode ficar triste. Sara
ResponderEliminarObrigada Sara! A parte de explicar a diferença tem sido feito, tanto em livros de meninos de todo o mundo, como do Elmer, como até do patinho feio. Ou até mesmo do Gigante. As mensagens vão sendo passadas. O “não poder falar” é que vai ter de ser treinado, porque até agora, como nunca tinha acontecido, não houve necessidade de antecipar essa questão. Acho que só lá vai com tentativa e erro :) obrigada
EliminarEmbora hoje não se note, eu tenho acne, e em miúda houve uma altura que tive muitas borbulhas e vivia incomodada com isso claro, cheia de complexos. Uma vez uma criança disse-me "que horror tens a cara cheira de borbulhas!!". Fiquei triste claro, mas não com a criança, aquilo foi de uma sinceridade sem maldade nenhuma.
ResponderEliminarTambém tenho filhos pequenos, e sinceramente dizer-lhes já que não podem falar sobre características fisicas/diferenças abertamente, também me parece limitador. O meu filho sempre que vê uma pessoa fala-lhe da cor dos olhos. Terei de dizer para ele não fazer mais isso? Claro que ninguém se ofende, mas na lógica de não falarem sobre diferenças fisicas devia-se englobar tudo... Mas e agora ele também não me pode dizer quando acha que tou bonita? Porque se pode, então também me pode dizer quando não gosta de alguma coisa (e diz)... Muito confuso.... !!!
Nessa situação ficaria sem palavras mas teria tido o mesmo tipo de reacção. Acho que tiveste bem. Dentro de tudo acho melhor não dizer nada à Luísa...