Sou amiga da autora no Facebook e até recentemente fui a uma consulta com ela para falarmos do sono da Irene. A Joana Paixão Brás leu este post (que a Constança fez no seu próprio Facebook) e pediu para falarmos com ela para saber se podíamos publicar aqui porque é importante. É mesmo muito importante. Espero que ajude algumas de vocês e que vocês ajudem outras mães a pensar assim, com o ritmo certo. Falei sobre o livro da Constança aqui.
"A Raquel estava preparada para ter um pós-parto organizado e tranquilo. Como muitas de nós, visualizou-se a viver as semanas após o nascimento da Carolina da mesma forma como vivia habitualmente: com tudo sob controlo. Portanto, eu entendi perfeitamente o que a Raquel me quis dizer quando soluçou ao telefone: “isto não é como eu pensava”.
O que estava a passar-se com a Raquel era que a Carolina estava a ocupar-lhe todo o dia e isso apanhou-a de surpresa.
«Dou-lhe de mamar e ela mama durante quase uma hora. Depois mudo-lhe a fralda e penso que agora ela irá dormir, mas ela não quer ficar na alcofa e chora. Tento acalmá-la, só sossega ao colo, comigo a andar pela casa. Dormita dez minutos e acorda.
Quando dou por mim já está novamente a pedir mama e eu não fiz mais nada entretanto. Depois tudo recomeça. Não consigo fazer mais nada. Não faço nada o dia todo».
Muitas mães reconhecem-se neste relato da Raquel.
Não se passa nada com a Carolina, ela está só a ser um bebé de três semanas.
Mas a exigência e a continuidade de cuidados que um recém-nascido precisa são quase sempre muito maiores do que aquilo que alguma vez pudemos antecipar.
Porquê?
Porque nos preparamos para cuidar de um bebé “cache”, quando na verdade os nossos bebés são bebés “carry”. Precisam dos nossos braços, quase tanto como precisaram do nosso útero. Partimos do princípio de que se formos organizadas e metódicas e rigorosas, tudo estará sob controlo.
De que teremos “rotinas” e que o bebé vai mamar de três em três horas e que depois dormirá sossegado e que, enquanto o bebé dorme, nós conseguiremos arrumar a casa ou cozinhar ou enviar emails, ou tomar um duche relaxante.
Quando isso não acontece, e na maioria dos casos, não acontece, sentimos que algo está a falhar. No caso da Raquel, ela própria sentia-se a falhar: “O que é que eu estou a fazer de errado para ela não querer ficar sozinha?”.
(...)
A primeira coisa que eu tenho que dizer à Raquel é que o que está errado não é ela, nem é a Carolina. O que está errado para a maior parte de nós é a ideia de que o pós-parto é algo que devamos “gerir”, como se gere um desafio no trabalho.
Inconscientemente, continuamos a procurar o bebé dos livros que lemos, sem saber que esse bebé não existe. Continuamos a acreditar nas mamãs de revista, que mantêm a casa impecável e cabem na roupa de antes da gravidez quinze dias depois de terem tido um bebé.
Procuramos em nós essa mulher, procuramos no nosso filho esse bebé e não encontramos.
Pois bem, para começar o caminho de verdadeiro entendimento com o bebé que temos no colo e com a mãe que nasce em nós, é preciso despedirmo-nos sem pena dessa mãe e bebé imaginário que na verdade nunca existiram a não ser na nossa cabeça"
Constança Cordeiro Ferreira in "Os Bebés Também Querem Dormir" (ed. Materia Prima, Abril 2015)
Imagem: Nikki McLure