4.07.2020

Não pensar em nada.

Ontem pintei com aguarelas pela primeira vez a sério, concentrada. Não se estejam já a rir. Fiz um cacto com uma flor, ao mesmo tempo que via um tutorial no youtube. Perdi-me nas horas. Misturei cores, pus mais ou menos água, usei um pincel mais fino para os contornos e outro maior para preencher. As miúdas estavam a ver televisão, o David a trabalhar lá dentro e eu só concentrada no que estava a fazer. Quando olhei para o relógio já era mais que hora de ir fazer o jantar. Ainda fiz um cacto a correr e uns ramos que estragaram o esforço do primeiro. Quer dizer, não estragaram nada, que isto não tem fim nenhum, o que interessa é o meio. E o meio foi bom. Consegui não pensar em mais nada. É disto que preciso, cada vez mais. Tirar meia hora, uma hora, do meu dia para não fazer nada. 

Até agora estive em teletrabalho, que me consumiu muito. Não o trabalho em si, de que gostei, mas a gestão. Apesar de vos ter passado as minhas estratégias para conseguir trabalhar a partir de casa, com miúdos, nem sempre (quase nunca, diria) correu bem. Deitava-me tardíssimo para conseguir. É duro. Queremos fazer as coisas que as educadoras sugerem com elas, queremos estar lá, brincar, deixar a casa minimamente apresentável (já que é aqui que passamos 24h do dia, fazer refeições minimamente saudáveis e trabalhar. Digamos que é... impossível. Quem disser que consegue fazer tudo bem e está ainda bem da mona deve estar a mentir. Ainda ontem comentei que recebi muitos emojis de espanto quando publiquei em story o estado da minha cozinha, um dia destes. Nesse dia, não conseguimos arrumar nada do almoço nem do jantar (com lanche pelo meio e sopa, etc) porque tivemos os dois de trabalhar bem (dar-lhe bem) à tarde e só depois de as adormecer consegui arrumar. Sim, estava em estado de sítio, mas também acho que espelha alguns momentos por que todos, caso tenhamos de trabalhar e acompanhá-las, passamos. É o que é. 

Neste momento, fiquei sem trabalho (sou freelancer em TV e os programas que estava a fazer estão agora parados, em stand by). Estava muito contente por estar a fazer conteúdos de programas que adoro, mas agora tudo mudou e já me habituei à ideia. Muita gente estará em situações mil vezes piores que a minha. Sei que vamos dar a volta.



Vou aproveitar esta fase para estar mais aqui, para vos dizer que séries ando a ver, que livros infantis encomendámos, que coisas ando a fazer com elas. E, quem sabe, ainda vos deixo aqui receita de ISCO para fazer pão!!! Desta não estavam à espera, pois não? Não encontrei fermento de padeiro online nem na merceeria aqui do bairro e estou a fazer o meu próprio fermento.  

Amanhã voltarei a pintar. Foi terapêutico, palavra. A melhor coisa até agora. Tenho sempre uma voz interior que me diz que não estou a aproveitar bem estes dias, que não estou a ser produtiva o suficiente ou que podia, ao menos, acabar de ver a série X, ler o livro Y, quando o que eu preciso mesmo mesmo é de conseguir, estando acordada, descansar a mente.  


E é isto. Por agora. Como estão vocês? O que têm feito para relaxar?

3.31.2020

Só coisas bonitas #01 - Despensa do Bairro

Acho que todos precisamos de coisas positivas. De ver iniciativas fantásticas, que nos dêem esperança. Por isso, resolvi inaugurar aqui uma espécie de rubrica (que vai durar mais do que as minhas tentativas de rubricas anteriores, prometo) que se chama "Só Coisas Bonitas".

Porque sei que vão ficar com um sorriso enorme, tal como eu fiquei, partilho convosco a iniciativa fantástica de uma família que temos a sorte de conhecer: uma despensa do bairro. “Dê o que puder, leve o que precisar”, com bens essenciais, mas também livros!
Obrigada Sofia, Zé Miguel, Xavier, Madalena e Santiago. ❤️

Não é a coisa mais fantástica que viram hoje?




Partilhem esta iniciativa! Quem sabe não inspiramos a que se criem mais "Despensas do Bairro" por esses bairros todos? 

E partilhem pff outras iniciativas fantásticas para nos inspirarmos e para nos comovermos com as coisas mais bonitas.


3.28.2020

Deixem-me chorar um bocadinho

Deixem-me chorar um bocadinho. Pois se há caixões insuficientes, se são precisos camiões militares para transportar tantos mortos. 
Deixem-me chorar um bocadinho. Se há pessoas a morrer sozinhas. Deixem-me chorar um bocadinho. Se tenho saudades de pessoas que são um bocadinho minhas, se sinto falta do cheiro da pele da minha mãe e das mãos grandes do meu pai. Do som dos copos a brindarem em casa da minha amiga Raquel e dos nossos abraços de despedida e das danças na sala. 
Deixem-me chorar um bocadinho. Se estou assustada e se me sinto claustrofóbica. Se não tenho uma varanda. Se me apetecia estar duas horas completamente sozinha e outras rodeada de pessoas. Se me apetecia andar de carro, com destino ou sem ele. 
Deixem-me chorar um bocadinho. Se não sei quando volto a ter trabalho. 
Deixem-me chorar. Mesmo sabendo que há quem esteja em situações piores e a sofrer muito mais. Deixem-me chorar um bocadinho porque é sinal de que sou sensível mas nem por isso frágil. 

Exteriorizar o que sinto, falando alto, desabafando, chorando, dá-me espaço para depois sentir tudo o que há de bom para sentir. Partilhem os vossos receios uns com os outros, não continuem a fingir que não vos afecta. Desvalorizar o que sentimos é só varrer para debaixo do tapete. 
Chorem um bocadinho. E depois continuem, mais leves, na luta. Todos temos uma.