Vocês já repararam que a Joana Paixão Brás e eu somos muito diferentes nalgumas coisas. Apesar de, em teoria, concordarmos com o estilo de educação que queremos dar às nossas filhas, a Joana é livre e eu aprisiono-me.
Não me lembro de ser de outra forma. E confesso que, até ter a Irene, adorava sê-lo. Quem assiste, vê apenas o quão intenso é tudo para mim, o quão rápido funciona a minha cabeça, o quanto "sofro". Mas eu sentia-me forte. Forte sempre que contrariava os meus receios. Ser ansiosa e subir a palco para fazer stand-up, por exemplo, era muito difícil para mim, mas retirava um prazer maior do que se me acobardasse. Na faculdade, começava a estudar para os exames com um mês de antecedência e na semana anterior relaxava. Dava-me gozo ver toda a gente de pantanas e eu já estar resolvida. Senti, desde sempre, que a ansiedade fazia parte da minha personalidade. E sempre tive a dúvida: serei assim ou estou assim?
"Por que é que hei-de ser diferente se tudo me corre bem?" É verdade que evito imensas coisas por receios que não consigo visualizar (e, por isso, tornam-se monstros). Se calhar é por isso que não gosto de sair à noite, de levar o carro para Lisboa, de fugir à minha rotina, de experimentar comidas novas, de sair para fora da minha zona de conforto... Até nascer a Irene, até viver com o Frederico (para ser mais honesta ainda), a ansiedade trazia-me problemas, mas sinto que também me trazia soluções.
Sempre vi a minha ansiedade como um caminho para a eficácia. Nunca reparei que me estava a aprisionar, achei apenas que era diferente de toda a gente. Aquela "toda gente" que adora passear, ir para sítios com barulho, viajar e conhecer coisas novas.
Nunca senti falta dessas coisas porque nunca me diverti quando as fiz. Ficava demasiado nervosa, não retirava prazer. Cheguei a ficar uma semana "em casa" quando fui a Malta e quando fui a Berlim também não conseguia passear sozinha. Do que tinha medo? Não sei. Tentei contrariar-me ao ir, mas não consegui mais do que isso.
Estava conformada com a minha maneira de ser. Tinha já encontrado os meus truques para não sofrer com isto e já tinha arranjado formas de pensar que me permitiam não ver o quanto isto me estava a prejudicar. Por ser articulada e aparentemente confiante também ninguém me confrontava com isso. Acabava por mentir aos outros tão bem quanto sempre me menti.
Agora é diferente. Está a ser.
Com a Irene e o Frederico apercebi-me do quanto a minha ansiedade me prejudica e à minha família. Impossibilitava-me de olhar para a minha filha e de perceber o que se passava, antes de lhe tentar impingir 42 mil soluções que me vinham à cabeça. Ia deitá-la 43 vezes por dia, sem que ela tivesse sono e não conseguia porque não conseguia acalmá-la por eu não estar calma. A quantidade de regras que impunha ca em casa por causa do barulho só por ter receio que ela acordasse. O Frederico deu em doido, praticamente não o deixava sair do sofá durante as sestas dela sem o fazer sentir-se culpado por poder acordar a miúda. Quem está de fora apercebe-se de que isto poderia ser menos difícil se eu tivesse outra postura e tem também muitas dificuldades em compreender que não é uma escolha. O meu cérebro está habituado a funcionar assim. Por muito que o meu outro lado queira que as coisas mudem, também não sei como hei-de mudá-las. Gostava de ser menos ansiosa? Sim, mas como? Não me vou embuchar em comprimidos, tenho medo. Parte dos motivos que leva as pessoas a serem ansiosas (não sou psicóloga) é a vontade que têm em controlar tudo. Medicar-me está fora de questão. É importante "estar acordada" durante o meu processo de mudança, tenho mesmo de falar com o meu cérebro.
Chorei muito com a Irene, o stress passava pelo leite e ela ficava stressada também, tivemos muitas mais dificuldades "que o normal" por este meu handicap. Sinto que não senti nada por ela quando ela nasceu porque a ansiedade também me tirou isso (apesar de saber que é muito comum e falei disso
aqui). Nunca consegui ser racional em discussões, muitas das vezes ficava estupefacta com as coisas burras que me saiam da boca só por não conseguir pensar. Tenho imensas dificuldades em ser optimista, mas sem saber explicar porquê. Fui o meu maior obstáculo nos maiores desafios da minha vida.
As coisas tinham que mudar.
Não é esta a mãe que eu quero que a Irene tenha. Não quero que ela fique com este ritmo de cabeça, com esta sensação de inquietude constante, quero que ela saiba apreciar silêncios quando está com outras pessoas e que consiga não achar estúpido ver um por-do-sol. Não lhe posso fazer mal, sou a pessoa que mais a ama. Agora é o momento para me tornar melhor. Afinal, a vida é longa também para crescermos, certo?
Estúpido é aquele que, fazendo as mesmas coisas, espera resultados diferentes.
Chega de ser "estúpida". Vou fazer algo por isso. Uma amiga falou-me de uma amiga que é psicóloga e, para além disso, que se formou em
hipnoterapia numa faculdade de medicina.
"Hipnose? Estás doida! Eu? Ahahah" - disse eu, imaginando um relógio à frente dos meus olhos e a minha figura de parva a fazer de "pomba gira".
Dei uma hipótese.
Querem que vos conte o resto? O que vos desperta mais curiosidade? Já foram hipnotizadas?