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2.04.2018

Sobre a porcaria dos rankings das escolas

Eu sou a boa aluna que via sempre o nome nos quadros de honra das escolas, que recebia diplomas e que terminava o ano com 5 a tudo, ou quase, que nunca teve um 3 na vida, e que entrou para a faculdade com 18,2 ou o que foi. Eu sou a aluna certinha, estudiosa, responsável, participativa, um regalo para qualquer professor e um orgulho para qualquer pai.

Mas eu... eu sou uma privilegiada e tenho noção disso. E eu, neste momento, adulta, em que penso sobre o assunto, tenho noção de que os diplomas são uma merda e de que os rankings da escola são uma falácia enorme e que só perpetuam as disparidades em vez de ajudar a atenuá-las. Eu, que penso sobre o mundo (e nem é preciso muito para se chegar a esta conclusão) tenho noção de que, por mais indicadores que incluam nestes rankings, os colégios e as escolas públicas de contextos privilegiados vão continuar a estar à frente. O que se quer então com isto? O que muda? O que nos acrescenta? 

Todos os anos a mesma luta, a mesma concorrência desleal para se concluir o quê? Que a escola 234 é melhor que a 300, como comparava o Alexandre Henriques, no Público? Em quê? Tem um melhor projecto educativo? Teve menos alunos retidos? Tem mais ou menos alunos que conseguem pagar explicações? Mostra o ranking que há ali alunos que em vez de estarem a estudar para a prova x tiveram de tomar conta do irmão bebé porque o pai estava no segundo turno do dia? Mostra o quê, exactamente? Não haverá escolas fantásticas, que fazem um esforço enorme para integrar todos e mitigar as carências, que fazem das tripas coração para ensinar e chegar a todos, e que não estarão num bom lugar no ranking? Valorizemos a escola.

A escola tem de ser muito mais do que um número, do que uma pauta, do que um lugar numa tabela. Onde ficam as necessidades individuais de cada aluno? Onde ficam os esforços de professores em fazer omeletes sem ovos?

Basta a esta cultura da humilhação. Basta aos egos. Basta a este modo de olhar para as escolas como um negócio. Basta a esta competição desleal, a este umbiguismo. 

Eu, boa aluna nas filas da frente, tinha pais presentes que me ajudavam a estudar ou que me pagavam explicações de alemão para que eu aumentasse um 16, a meu pedido, e sabiam quando tinha testes. Tinha férias. Tomava o pequeno-almoço em casa. Tinha presentes nos anos e fora deles. Tinha actividades fora da escola. Tinha bons professores, uma escola onde não passava frio, e alunos de classe média e média alta com quem podia disputar as melhores notas, fazer trabalhos de grupo e aprender. Eu, se tivesse nascido em Regosive*, atrás do sol posto, se tivesse pouco acompanhamento, passasse necessidades e não tivesse boas notas, não iria precisar deste espectáculo, que me esfregassem na cara o quão má era eu e a minha escola. Eu, se tivesse nascido em Regosive, atrás do sol posto e se quisesse ter esperança para dar a volta à situação, não quereria este negativismo todo e este veredicto quanto ao meu futuro, nem este perpetuar de preconceitos. Quereria um movimento da sociedade que procurasse maior justiça nas escolas e que pudesse oferecer às escolas públicas de Regosive as mesmas condições de trabalho da escola privada na capital xpto. E, também, que os exames e os rankings não fossem um fim último, uma obsessão colectiva, em prol dos quais tudo funciona.

O propósito da escola não é nem pode ser esse.




 *nome inventado




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