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12.28.2015

As Marias - Três é a conta que Deus fez

Até há umas semanas, ter duas filhas deixava-me preenchida - mais do que isso, realizada. Dava por mim muitas vezes a olhar para elas enquanto brincavam e a pensar que ver aquelas duas crescer, e envelhecer junto delas, era a maior felicidade que esta vida me poderia dar.  Mas um dia, há bem pouco tempo, um teste de gravidez deu positivo e eu fiquei sem tapete. “Então mas agora vou ter mais um filho?”. “ Como é que isto aconteceu?”, mandava para o ar enquanto o pai ria, sem tirar os olhos de mim – provavelmente com os nervos. “Mas eu tomei tudo direitinho, nunca me esqueci”. Pois foi, tudo direitinho. O problema é que também tomei direitinho um antibiótico que, provavelmente, fez curto-circuito com a pílula… A verdade é que vem aí o terceiro filho. E escusam de fazer esse ar de surpreendidas, porque de certezinha que já leram nas revistas. Aliás, estas descobriram antes da maioria das minhas tias-avós. Até porque no início só contei a três pessoas. Estava a tentar mentalizar-me – e, honestamente, a tentar convencer-me de que era uma boa notícia. O pai repetia-me que sim, mas para mim não foi imediato. Foram semanas atribuladas, com pensamentos e estados de alma contraditórios.

Agora, as minhas 16 semanas de gravidez falam-me em forma de cliché e dizem-me que este é “o melhor presente” que podíamos ter recebido. Que “três é a conta que Deus fez”. Às vezes, encaixar num cliché é bom, é confortável. E a verdade é que o meu coração de mãe de duas sofreu um novo estímulo e dilatou mais um bocadinho. E à medida que a barriga cresce – e se ela cresce! - o meu coração cresce com ela, numa harmonia que me diz que “está tudo bem”, “vai correr tudo bem”.

Continuo a ter pesadelos com o final da gravidez, o parto e o pós-parto. E não sinto saudades dos primeiros meses, das fraldas e das noites mal dormidas. Mas já não é nisto que penso em primeiro lugar quando, a meio do dia, sem razão aparente, me lembro de que estou grávida e sorrio – às vezes só para dentro, outras para fora, feita tonta.

Agora, é rezar para que as minhas amigas me devolvam tudo o que lhes emprestei – e/ou dei – porque já tinha “fechado a loja”. Por enquanto, certo certo é que a criança não vai ter frio nos pés…



Catarina Raminhos, mãe da Maria Rita, da Maria Inês e grávida de 16 semanas

4.20.2015

Afinal Havia Outra (#20) - Birras: sabem como lidar com elas?

Quatro anos e duas filhas depois, eu continuo sem saber lidar com as birras. Pensavam que iam encontrar respostas neste texto, não é verdade? Mas não - daí o ponto de interrogação no título…

Sempre que uma delas dá início a uma birra, a primeira coisa que eu faço – depois de respirar fundo, muito fundo – é pensar na injustiça da situação. “A sério?! Estás a começar uma birra e ainda agora estávamos aqui tão bem a brincar?” Ou então vou ainda mais ao detalhe: “Acabei de te comprar mais uma camisola da Elsa do Frozen e ontem deixei-te comer um ovo kinder e tu fazes-me isto?!” No fundo, a uma birra delas eu respondo com uma minha, ainda que a minha se desenvolva ao estilo Ally McBeal, no interior da minha cabeça e quase sempre com muitos resmungos, gestos e alguns palavrões à mistura.

E depois penso em todos os conselhos que já me deram até hoje: “Sem público não há espetáculo… conta até dez e respira fundo… já disseste que não, por isso é não até ao fim… coerência é segurança… pensa em coisas boas… bahhhh!” Um verdadeiro desatino!

Eu sei que as birras fazem parte do crescimento das crianças e são fundamentais para o desenvolvimento da personalidade delas. Mais do que isso, são uma forma de expressarem a frustração que sentem perante alguma situação. Mas conseguem partir de coisas muito estúpidas mesmo. “Mãe, não queria o pão partido em três, era em dois” ou então fazerem um espetáculo de todo o tamanho porque queriam carregar no botão do elevador e eu já tinha carregado…

As birras conseguem ser momentos terríveis para nós, pais, aos quais é preciso sobreviver – e por “sobreviver” quero dizer não nos passarmos (muito) da marmita, tentar que a coisa dure o mínimo de tempo possível e passarmos alguma mensagem de jeito às miúdas. Confesso que já tive de pedir um “desconto de tempo” à minha filha para subir a escada, entrar no meu quarto, fechar a porta, mandar um berro valente, respirar fundo e voltar a descer a escada para terminar a conversa. 

Tenho para mim que, no final de uma birra, a coisa até não correu mal se eu mantive a minha posição desde o início, se ela percebeu porque é que não podia fazer ou ter aquela coisa naquele momento, se não dei por mim aos berros e se acabámos por dar um abracinho. Mas nem sempre é assim. E a única certeza que temos é que, tal como as ondas do mar, depois desta há-de vir outra. Mais cedo ou mais tarde, dependendo da maré…

Catarina Raminhos, mãe da Maria Rita e da Maria Inês

3.09.2015

Afinal Havia Outra (#13) - Desculpem lá o desabafo!

Vou entrando assim, no vosso dia, sem pedir licença nem nada, mas preciso de desabafar. As últimas semanas da minha vida têm sido caóticas. As “Joanas que sabem” estão à espera de um texto meu e eu nem sei o que escrever, porque não tenho tempo sequer para pensar.

A minha filha de dois anos teve varicela. Dez dias em casa da avó, pomadas para aqui, mais xaropes para ali, ir buscar uma à avó, a outra à creche, chegar a casa, dar banho com farinha Maizena – sim, ajuda a secar as borbulhas e é ótimo - dar jantar, deitar as miúdas e adormecer toda torta com elas, vestida e tudo e perceber que são quatro da manhã e a televisão lá em baixo ainda está ligada.

A varicela vai-se, vem uma infeção urinária, antibiótico e a miúda lá fica boa e regressa à creche. Eis senão quando aparecem as primeiras borbulhas na mais velha. Deixar uma na creche, outra na avó e por aí em diante - que eu preciso de desabafar mas escuso de estar a repetir-me porque vocês não têm culpa nenhuma. Eu cheia de trabalho, o pai cheio de trabalho e é ver um e o outro a adormecer em qualquer lado – tipo zombies – ao mesmo tempo que a roupa para lavar quase chega ao teto da casa de banho e a loiça nem sempre chega à máquina.

Depois de tudo isto - e livres da varicela - a mais velha fica com gripe, com direito a uma ida para as urgências a meio da noite e tudo. “Devíamos marcar um fim-de-semana em qualquer lado”, diz ele. Mas como, se as avós também estão as duas doentes? (Ainda não vos tinha contado estar parte, pois não?) Pois. E fica assim a possibilidade de ir substituída pela vontade de ir. Parecendo que não, sempre fica o coração mais quentinho por sabermos que ambos queríamos muito ir. Só que não dá.

Para ser sincera, acho que esta canseira toda já vem de muito antes das varicelas. Acho mesmo que a última vez que descansei a sério foi no dia de Natal. De lá para cá foram semanas desenfreadas atrás de semanas desenfreadas. Combinações de almoços com as amigas adiados, baldas a jantares de aniversário, duas peças de teatro que queria muito ter visto e não vi, já para não falar dos filmes que entram e saem do cinema e eu nada! Pela primeira vez na minha vida, não vi um único filme nomeado para os Óscares...  

E, de repente, esta semana lá se arranjou quem ficasse com elas e fomos jantar fora no dia do 16º aniversário de namoro. Vesti uma camisa preta que já não saía do armário há séculos e pus um risquinho nos olhos para “disfarçar”. Quando íamos a sair de casa até julgo ter sentido borboletas na barriga e não sei se era por estar a sair com o namorado ou simplesmente por estar a sair. O que eu sei é que foi tão bom conversar como dantes, com tempo para acabar todas as frases sem interrupções. Recordar os primeiros tempos de namoro – chiça, foi há tanto tempo, caraças! E renovar vontades: “Catarina, temos mesmo de ir os dois de fim-de-semana um dia destes senão caímos para o lado”. E aí, nesse pequeno oásis num deserto de cansaço e de tarefas para cumprir, percebemos que, mesmo cansados e muitas vezes desencontrados dentro de quatro paredes, estamos na mesma. E “na mesma” não é mau, é bom. É muito bom. Acho mesmo que era isto que o Kundera queria dizer quando definiu a felicidade como “o desejo de repetição”.

E pronto, agora que já desabafei, saio de fininho para ver se me lembro de alguma coisa para o texto que tenho de entregar...

Catarina Raminhos, mãe da Maria Rita e da Maria Inês

2.16.2015

Afinal havia outra (#08) - Viver no campo ou o elogio das coisas simples

Lá fora, nos dias quentes cheira a flores e a alfazema; nos frios, a terra molhada. E a chaminé dos vizinhos não cheira a fumo, mas a pão quente. Cá dentro, as tábuas de madeira rangem como quem se queixa da idade e o teto não é baixo, mas aconchegante. 


A primeira vez que a Maria Rita entrou na nossa casa ainda morava na minha barriga. Com uma noção espetacular de timming, achámos que bom bom era fazer a mudança com uma recém-nascida nos braços. No dia em que ela nasceu, o pai trouxe os avós e os tios a conhecerem a casa e eu, que sou dada a atribuir significados especiais às coisas, achei que isso ia dar sorte – vá-se lá saber porquê!  
Tinha apenas uma semana de vida quando a trouxemos cá. Lembro-me de olhar para ela, toda enroscadinha no sling, enquanto esperava que nos abrissem a porta, e de não saber se aquela sensação quentinha vinha do corpo dela colado ao meu, ou do coração, que transbordava de coisas boas.
Quando me perguntam sobre como é viver numa aldeia normalmente digo só que adoro, porque na verdade apetecia-me fazer poesia – soubesse eu fazer poesia! – sobre isso. Eu gosto de tudo. Tudo. E para mim os defeitos nas ombreiras das portas ou nas esquinas da parede não são imperfeições, são traços de personalidade. 

A nossa casa não tem número, tem nome. E eu acho que isso lhe dá mais alma – mesmo que se chame “Casa da Mó” e mó nem vê-la! Na verdade, na parede lê-se “Cãsã dã Mó”, mas isso é porque os outros donos tiveram preguiça de esperar pelos azulejos dos “A” normais e compraram com til…
Aqui, aprendi que a felicidade não é algo abstrato que paira no ar ou que habita os nossos desejos. Ela está nas coisas mais simples, em momentos específicos do dia-a-dia. Quando as minhas filhas correm caminho fora até casa dos vizinhos sinto uma felicidade imensa por toda esta liberdade, por terem espaço para crescer... com espaço. Por saber que toda a gente aqui lhes quer bem. A Avó ‘Melita, o Ti’ Toino, a Ti’ Margarida. Todos. Uma família que nos foi dada como um prémio na raspadinha: não fizemos nada, tivemos só sorte – muita sorte - e eles estão aqui para nós.
Ou até quando o portão da vizinha fica aberto para podermos ir até lá com as miúdas, porque elas adoram apanhar laranjas e limões e espreitar as galinhas. É como se tudo fosse um bocadinho nosso. As próprias hortas acabam por ser também um bocadinho nossas, porque os legumes e as frutas vão aparecendo à nossa porta, consoante o que a terra dá. E nós também deixamos o portão aberto, para um café, para uma conversa, para verem as miúdas e saberem que estão melhores da constipação.   


E é tudo bonito e perfeito? “Mães que sabem”, esta que vos escreve nasceu e cresceu em Lisboa e contava os dias para ir de férias para a “terra”, para fugir da cidade. E se há sonhos que estão tão longe de se tornar realidade, porque é que não agarramos com as duas mãos aqueles que só dependem de nós? A nossa casa custou o mesmo que um T2 nos arredores de Lisboa. Depois, claro, há as portagens, a gasolina e o saber que não levo menos de 35 minutos a chegar a casa. Mas para mim, compensa cada minuto e cada cêntimo. Porque no final do dia regresso a casa, ao sítio onde somos mais família, ao sonho que um dia tivemos, ao chão que range e ao teto que aconchega.

Catarina Raminhos, mãe da Maria Rita e da Maria Inês

2.02.2015

Afinal havia outra (#04) - "Mãe, viste o monstro azul?"

Mortinha de saudades do pai que estava longe há duas semanas – e com apenas dois anos e meio - a Maria Rita voltou-se para mim e disse: “Ó mãe, se as nuvens fossem minhas amigas sopravam sopravam sopravam e o avião do pai chegava cá mais depressa!”



Uma pessoa passa os nove meses da gravidez a falar com eles, a cantar para eles – pobres coitados! - a partilhar tudo com eles. Mal nascem, queremos contar-lhes as histórias que nos contaram em crianças e dizer-lhes tudo. Tudo! E depois eles começam a falar e nós perdemos o pio.

Quando as nuvens sopraram sopraram sopraram e o tal avião do pai chegou, houve uma tarde em que ela pediu uma bolacha de chocolate. Estávamos na cozinha e o pai disse-lhe que se quisesse podia comer uma bolacha maria – “das outras não”. Ela olhou para mim, olhou para ele, voltou a olhar para mim e disse, apontando para o pai: “Quando é que ele volta para o Brasil?”

Com quatro anos, as “saídas” dela continuam a ser espontaneamente engraçadas, mas estão cada vez mais salpicadas de curiosidade. Há umas semanas, estávamos a passear e ela perguntou-nos o que é que era aquela casa junto ao mar, que parecia um castelo. O pai disse-lhe: “Aquele era o castelo do Príncipe do Mar!”. “Então e porque é que já não é?”, perguntou ela logo de seguida. “Filha… já não é porque ele já não vive lá”. Dois segundos de silêncio: "Porque já não vive lá ou porque isto é só uma história inventada?".

A dúvida fica no ar, para dar trabalho à imaginação – à dela, desassossegada por natureza, e à nossa também. Como daquela vez em que entrei na sala e ela perguntou se eu tinha visto o monstro azul. “Monstro azul, monstro azul… mas que raio?!” Eu juro que pensei em bonecos, livros, puzzles e até roupa com estampagens de um monstro azul, mas nada. Na minha cabeça, só princesas da Disney. “Monstro azul, filha? Não sei do que é que estás a falar…” “Ah, esquece mãe, claro que não viste porque assim que tu entraste ele escondeu-se debaixo do sofá!”

A imaginação das crianças não conhece limites. Inventam jogos, canções, palavras, tudo e mais alguma coisa. Tanta coisa que eu dou por mim a invejar o “disco rígido” delas. Dava-me jeito na altura de responder a saídas do género “estava aqui a imaginar que amanhã não tinha escola e estava a ser tão bom!”. Não estamos preparados para isto e muito menos para conversas sobre namorados:

Eu: então, o teu namorado ainda é o Vasco?

Ela: sim, ele não mudou de nome...

Eu: pois, eu sei, mas podia ser outro, tipo o Rodrigo ou o Martim...

Ela: achas mãe?! O Rodrigo e o Martim portam-se mal e não comem o almoço todo!

Eu: e o Vasco porta-se bem é?

Ela: também não, mas é o mais bonito...


Catarina Raminhos
mãe da Maria Rita, de 4 anos, e da Maria Inês, de 2 anos

1.26.2015

Afinal havia outra (#03) - Para as Marias, com humor

Quando, às 14 semanas de gravidez, o médico anunciou que vinha aí uma menina, o pai ficou desapontado. Para ele, só podia ser menino – o menino que ia levar todos os domingos desta vida ao estádio da Luz. Mas não, era menina. E então substituiu o trauma por uma teoria interessantíssima acerca de um ser com apenas 14 semanas de gestação: “E se ela fizesse stand-up? E se ela fosse mesmo boa a fazer stand-up? Era do caraças!” – sendo que o pai delas nunca diz caraças, diz a outra palavra…
Nessa altura, eu estava preocupada com outras coisas. Era a primeira filha e o meu espírito estava constantemente a ser assaltado por dúvidas avulso: Será que estou a comer o que é suposto para ela crescer bem? Será que vai ser saudável? Vai nascer de parto natural ou cesariana? Pensava também, e desculpem-me a futilidade, se iria ser bonita. Não sei porquê, mas tinha medo que a miúda viesse feia. E se calhar veio, mas para mim - que sou mãe dela - é gira que se farta!
Mas para o pai o importante era ter sentido de humor. E - vá-se lá saber se ele fez alguma promessa à Nossa Senhora das Piadas ou o raio – a miúda tem mesmo sentido de humor. É uma característica dela, muito vincada e que ela vai aperfeiçoando da mesma forma que aperfeiçoa a forma de desenhar ou de falar – agora anda feliz porque já diz “prato” em vez de “pato”. Na verdade diz “perato”, mas ninguém tem coragem de corrigir.
E a mais nova não é diferente. É muito trapalhona a falar mas é muito expressiva, muito física e gozona – portanto, esta coisa do humor só pode estar em grande no código genético delas.
A relação do pai com elas também inclui as rotinas dos banhos, das refeições, do deitar e do “ralhar”, quando é preciso – não há cá polícia bom e polícia mau! Mas é, sobretudo, uma relação de brincadeira e de conversas parvas. Tenho não um, mas três palhacinhos em casa – e não duas, mas três crianças. Às vezes isto é uma canseira desgraçada, mas a maior parte do tempo é muito fixe e divertido.
Um dia ele lembrou-se de gravar uma dessas brincadeiras e assim nasceu o primeiro vídeo das Marias, este:

Seguiram-se outros e em todos vemos o pai a provocá-las, a Maria Rita a reagir e a Maria Inês a borrifar-se para tudo – tal como na “vida real”.
 



O pai diz na brincadeira que os vídeos vão servir para as envergonhar perante os namorados. E diz a sério que os faz para que elas possam lembrar-se dele, da infância e das brincadeiras deles. E isto derrete-me o coração.
São criticados por uns e elogiados com carinho por outros. Aliás, foi assim que percebemos que têm mais de bom do que de mau. Há pais que repetem estas brincadeiras com os filhos em casa e depois contam-nos como correu. Outros dizem que elas mais tarde vão vingar-se – como a médica que, na sexta-feira, viu a Maria Inês na urgência e esperou pelo fim da consulta para dizer “Então, Maria, as tuas melhoras e vê lá se começas a engendrar um plano com a mana para tramar o papá!”
Para mim, são pequenos quadradinhos de BD que ilustram a vida cá por casa – lugar onde tentamos, todos os dias, não levar a vida demasiado a sério.
 Catarina Raminhos, mãe da Maria Rita e da Maria Inês


1.19.2015

Catarina e as Marias (#01) - Filha, vais ter uma mana!

Com apenas 18 meses, a Maria Rita recebeu a notícia: “Filha, vais ter uma mana!”. Não queríamos só uma, por isso decidimos lançar-nos à aventura, sem medos – com alguns, na verdade.





Ela reagiu com alguma indiferença, e foi também com indiferença que começou a ver a barriga da mãe crescer. Só nos últimos meses é que ficava mais colada ao meu umbigo e chamava pela “Minês” – na esperança de receber alguma mensagem vinda do interior daquele enorme balão (estão a ver as fotos? Ainda faltavam dois meses inteirinhos…).

Mas o balão rebentou, tinha a Maria Rita dois anos, e aí é que foram elas. Quando regressei a casa com a mana bebé nos braços, os olhos dela pareciam os de um cachorrinho abandonado e só lhe faltou fazer o pino para chamar a atenção. Aí eu percebi claramente que dar-lhe uma irmã foi, ao mesmo tempo, a melhor e a pior que coisa que lhe podíamos ter feito. Mas, caramba, eu também tive duas irmãs e só me fez bem. Ninguém morre por causa dos irmãos – quer dizer, tirando Abel e Caim… 

No meio das mazelas resultantes de um parto natural de um bebé de quase 4,5 quilos (não, não me enganei a escrever, a miúda parecia mesmo um bezerrinho), das fissuras nos mamilos e da desregulação hormonal - céus, que quadro de terror! - eu deparei-me com mais um drama. E agora? Como é que vamos fazer isto?

Mas atenção “mães de primeira viagem com vontade de se lançarem na segunda”, é mais cansativo do que difícil. Com as tarefas bem partilhadas a coisa dá-se. A mãe dá de mamar, o pai põe a arrotar e chama-se a filhota mais velha para o colo da mãe. Ou então, na ausência do pai, dá-se a maminha a uma e conta-se uma história acabadinha de inventar à outra.

Não há cá super-mães nem super-mulheres, não me venham com tretas! Nos primeiros meses temos de olhar à volta, ver a sala num estado de calamidade e pensar: “que arrumadinho que isto está!”. Ou então comer frango de churrasco três vezes na mesma semana e pensar que é importante variar a alimentação e por isso “hoje vai de arroz porque da outra vez foram batatas de pacote”. Isso e sabermos dar desconto a nós próprias – confesso que demorei algum tempo a pôr isto em prática...

Ainda hoje não sei se o que fiz nesses primeiros meses é o mais acertado - provavelmente porque isso não existe. E não sei se não acabei por dar mais atenção à mais velha, por saber que estava mais atenta a tudo, mais sensível. Mas à medida que o tempo foi passando fui – fomos – tentando equilibrar as coisas tranquilamente, de forma natural.


A verdade é que elas dão-se bem, da forma como os irmãos se dão bem: não podem viver uma sem a outra, nem uma com a outra. Lutam – literalmente – pelas mesmas bonecas, lápis de cor, casacos, bolachas... Mas brincam muito as duas, têm grandes conversas e olhar para elas é maravilhoso. A mais velha finge que sabe ler e conta histórias à mais nova, que ouve muito atentamente (durante os dois minutos que são o limite máximo de paciência dela para qualquer tarefa). Dão beijos uma à outra, abraçam-se muito e dizem que gostam da outra. E o meu coração de mãe acredita que, por agora, isto é capaz de chegar…


Catarina Fernandes Raminhos, 34 anos, tem duas filhas, a Maria Rita, 4 anos, e a Maria Inês, 2 anos. É casada com António Raminhos, humorista, coisa que às vezes não deve ter gracinha nenhuma. Assim que engravidou, foram viver para o campo, onde querem criar as filhas no meio das galinhas, salvo seja, e receber sacos de laranjas (sabem pouco...). É a mais recente colaboradora do blogue "A Mãe é que sabe", com a rubrica "Catarina e as Marias".