11.27.2014

Antes e Depois dos Miúdos (#02)

ANTES
Chegamos a casa depois de um dia extenuante de trabalho. 
Pousamos a mala, as chaves e o guarda-chuva e descalçamo-nos para não sujar a casa.
Deitamo-nos um bocado no sofá.

Meio sonolentas, fazemos um prato XPTO para impressionar a cara metade ou encomendamos sushi. Pomos a mesa, a média luz, com uma música clássica para criar ambiente e manter a ilusão de que somos pessoas interessantes, e decoramos a mesa com umas flores frescas.

Tomamos um banho relaxante e perfumamo-nos. Ele chega, jantamos, vemos um filme ou uma série, temos uma sessão de sexo escaldante (ou 5 minutos, mas na loucura!) e ainda temos tempo para continuar o livro que está na cabeceira.
São 01h da manhã e vamos dormir.

DEPOIS
Chegamos a casa depois de um dia extenuante de trabalho, de sair a correr para ir buscar o bebé e de apanhar trânsito (mais meia hora na creche, coitadinho), e fazemos um plano mental da próxima hora. 
Pousamos cuidadosamente a mala, as chaves, o guarda-chuva, o ovo (com ele a dormir), a mochila dele, e descalçamo-nos para não fazer barulho. 
Sonhamos em deitarmo-no no sofá, mas enquanto ele dorme mais uns minutos, vamos pondo a sopa a descongelar, estendemos a roupa que ficou na máquina e vamos pensando no jantar.

Completamente derreadas, pomos a mesa, o bebé acorda, damos-lhe a sopa e a fruta com ele a chorar ou a esfregar os olhos e pomos o Big Bugs Band ou a Galinha Pintadinha no tablet para o distrair. Depois, damos-lhe banhinho, ele chora a vestir o pijama, contamos-lhe uma história, damos-lhe mama, mimo e cama. Pensamos "ele vai dormir já" de tão cansado que está. Pois, mas ele põe-se de gatas agarrado à cama, ele fala, ele grita e ele chora. Ele quer tudo menos dormir.

Comemos só lá para as 23horas os restos do jantar do bebé ou uma coisa qualquer feita à pressão, lavamos os dentes porque tem de ser, mas já nem temos coragem de tirar a maquilhagem de palhaça que fizemos a correr de manhã (mas isso ninguém precisa de saber). Começamos a ver um episódio de uma série qualquer e, nem 10 minutos depois, adormecemos. Tentamos dar um beijo de boa noite à cara metade mas já nem a encontramos bem no escuro. Quando já estamos a entrar naquele sono bom e profundo, o bebé chora. Isto repete-se duas ou três vezes, nas noites boas. E é Natal quando o bebé não se mija todo.


11.26.2014

Filhodependentes

Vamos começar por confessar: pertencemos todas ao grupo de pessoas que consegue estar a falar ininterruptamente durante 30 minutos sobre os nossos filhos, não é?

Mas se bem se lembram, há uns aninhos, revirávamos os olhos quando na mesa ao lado, no restaurante ou na cantina do trabalho, ouvíamos uma grupeta de mães a falar de cocós, do infantário, das roupas que se esfolam nos joelhos, das viroses que por aí andam. 

Dizíamos ao nosso grupo de amigos “Ai! Eu quando for mãe não vou ser assim. Quero ter vida própria. Quero ser interessante”. Pois, minhas queridas, a verdade é que nos tornamos no grupo de filhodependentes que não sabem quando parar. Cinema? “O último filme que vi foi o Avatar…” Música nova? “A Galinha Pintadinha conta?” O Sócrates foi preso em Évora? “São todos iguais”. Por muito que queiramos não conseguimos ter grandes temas de conversa nem sair das frases feitas.
Mas vamos tentar?

Eis o que vos proponho, qual guru: fazer um exercício simples para tentarmos curar esta filhodependência.

Inspira. Expira.
Primeiro passo: assumir que somos chatas.
Todas juntas, dizer esta mantra: “Eu, mãe da Isabel (nome do vosso filho, ou seria só parvo), sou chata. Ninguém quer saber da cor do ranho da minha filha. Ninguém ganha nada com a informação de que ela já come sopa com carne. Todos os bebés fazem isso.”
Inspira. Expira.

Segundo passo: ler nas entrelinhas. No início vai ser difícil controlarmo-nos, mas o mais importante é perceber que já estamos a ser chatas. Quando?

  1. Quando percebemos que ninguém nos está a fazer perguntas há, pelo menos, 5 minutos.
  2. Quando o interlocutor ficou com os olhos molhados. Não, ele não está comovido, apenas acabou de bocejar discretamente.
  3. Quando o interlocutor faz comentários como “ah, que giro”, “hã hã”, “tão bom”, a olhar para o telemóvel. Não é tão giro, nem tão bom. Ele está só a ser simpático.
  4. Quando o interlocutor tenta mudar o assunto nem que seja para falar da meteorologia e nós aproveitamos para dizer que temos o miúdo constipado ou que lhe comprámos um gorro novo. Ninguém quer saber!
  5. Quando o interlocutor revira os olhos. Não, ele não está a ver a mosca a passar, nem lhe entrou nada para o olho. Ele só não quer ouvir-nos mais!

Terceiro passo: fazer uma lista de coisas interessantes para dizer. Enquanto estamos na sanita, pegar no telemóvel e ler as gordas das notícias. Mesmo que não consigamos aprofundar muito os assuntos, podemos lançar temas novos! E não, notícias que envolvam criancinhas não contam!

Quarto passo: para que esta mudança nas vossas vidas não seja muito repentina, ponham um penso no braço. O penso é o "A Mãe é que sabe". Venham cá pôr a conversa em dia, contar-nos como é o ranho dos vossos filhos e ser chatas. Nós não nos importamos.

Estou à espera da cabeça partida

Oh. Meu. Deus.
Já sofro por antecipação, para depois o golpe não ser tão forte... Não sei como vai ser daqui para a frente.
Mães que têm filhos terroristas, como aguentam? Como aguentam estar constantemente com o coração nas mãos? Saber que o "não" não chega. Ou o castigo ou a palmada no rabo...
O Lucas ainda só tem 9 meses e eu já consigo antecipar o futuro dele... Cabeça, braço ou queixo partido, em algum ponto da sua infância. Ou as três hipóteses e mais algumas. Quando digo que ele é terrorista se calhar estou a exagerar um bocadinho. Ele é aventureiro, curioso, destemido e todo despachado. E eu tenho imenso orgulho nisso! E é assim que ele é feliz: a explorar, a testar o limite, a observar com as mãos tudo muito detalhadamente. Quer ir, vai. Quer mexer, mexe. Quer meter na boca, mete.
Mas isso vem com um preço. Eu sei. O pai dele era assim... Metia-se em cada alhada. Chegava a casa todo esfolado, ou com sangue em alguma parte do corpo. Chegou a ser atropelado! Compreendem o meu pânico, não compreendem? Eu não era assim. Eu era sossegada. Tinha medo. Gostava de ficar a brincar no mesmo sítio, horas e horas à volta de um brinquedo. Eu era feliz assim. Mas fora a parte da segurança, não quero que o meu filho cresça à minha imagem. Quero que seja ele próprio, igual a si, com a sua identidade e personalidade.

Só queria saber como fazem, mães de miúdos terroristas. Porque isto me assusta.