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3.14.2016

Eu não consigo arrumar a cozinha e deixar a miúda a chorar na sala.

Ontem, a passear pelo parque da Serafina, encontrei uma mãe. Esta mãe estava, tal como eu, a passear com a sua bebé e mostrar-lhe os patinhos. A Irene engraçou com a bebé e abraçou-a imensas vezes e deu-lhe muitos beijinhos. A mãe acabou por dizer que lia o nosso blogue. Não disse só isso, deu-me a entender que o blogue a ajudava a sentir-se menos desamparada, que estes meses não têm sido só bons e que melhor do que ler o nosso blogue, só alguém lhe limpar a casa toda enquanto repusesse o sono. 

Olhe para esta mãe. Cansada, mas a viver o sonho. Era domingo e quis ir passear em família, para a bebé L. apanhar um bocadinho de sol, para esticar as perninhas, para ver os patinhos. Estava curvada a segurar as mãos da bebé para que esta fosse dando passinhos. Agachei-me para ficar à altura delas enquanto conversávamos. Conversámos pouco, mas muito. 

A mãe disse-me que o pior era não conseguir dar conta de tudo. Que estar em casa com a filha é fazer muita coisa ao mesmo tempo e que depois não conseguiam compreender, quando chegavam a casa, como é que a casa estava naquele estado e o que tinha feito o dia todo para aquilo estar assim. 

"Eu não consigo arrumar a cozinha e deixar a miúda a chorar na sala". 

Muito respeito por estas mães que têm de ultrapassar os primeiros meses e sozinhas. Por um período em que estamos debilitadas, fracas, a fazer luto da nossa identidade passada e ainda em processo de reconhecimento da cria que temos à frente. Estes meses em que ao mesmo tempo que nos julgamos incapazes de fazer coisas, temos de fazer as coisas mais importantes do mundo. Vi nos olhos clarinhos da mãe, com o sol a bater, que ela precisava de dormir em concha e de chorar um bocadinho. 

Precisava que alguém lhe dissesse: "caga (quero mesmo usar esta palavra, sorry) na roupa, na loiça, no pó, no chão e vai dormir quando a miúda adormecer". 

Infelizmente precisamos de ouvir isso dos outros porque não é o que dizemos a nós próprias. Nós não conseguimos borrifarmo-nos para as tarefas da casa porque sentimos que é da nossa responsabilidade e porque aquilo que "os outros" nos dizem sobre "o que fizemos os dia todo" é também o que dizemos a nós próprias e, portanto, falhamos. E falhamos todos os dias, em todas as tarefas. Ainda para mais com uma descarga hormonal a acompanhar e privação de sono. A Pide bem que poderia ver os primeiros meses do pós-parto como a pior tortura de sempre. A par de, como disse esta mãe, nem sempre ser mau. Claro que não é. Há alturas em que os cheiramos e ficamos loucas e vemos que chegamos à etapa mais gratificante da nossa vida, mas há outras alturas em que não: de madrugada, durante a noite, durante as birras, durante as afinações necessárias até passarmos a conseguir ouvir bem o que um bebé quer e não estarmos em constantes apalpadelas e a morrer de medo de errar. O pós parto é uma discoteca com música daquelas bem aceleradas aos altos berros e nós temos de conseguir ler um livro. É complicado, é frustrante, é cansativo, é... bom, "nem sempre é bom". 



Queria dizer-te que vai tudo passar. E disse, mas queria ter dito de outra forma. Sem tanta gente à volta. Sem teres que estar a segurar a menina e sem poderes chorar. Queria dizer-te que apesar de não te conhecer, que te adoro e que não me importava de limpar a tua cozinha para poderes dormir. Que lamento que estejas sozinha nesta fase, a fase em que já nos sentimos tão sozinhas, mesmo que não estejamos e agora que ganhamos mais uma pessoa na nossa vida. 

Esquece a cozinha. Consegues? Consegues ver tudo aquilo que não importa agora? Verbaliza. Se te fazem pressão para arrumar a casa, diz a ti mesma que não tem mal não fazeres tudo. Diz. Um dia vais dizer isso erguida à pessoa que também te faz sentir assim (além de ti própria). Tu és mãe agora. A casa pode esperar. A casa é de todos os que lá vivem. 

Dá-te um desconto.