1.23.2015

Afinal havia outra - (#01) Grávida pela primeira vez

Tenho saudades de estar grávida. Grávida pela primeira vez. É algo irrepetível que nos marca para sempre. Tenho vivido de perto a primeira gravidez de uma amiga e é incrível ver nela as minhas dúvidas, as primeiras descobertas e o amor que cresce desde o primeiro minuto. Desafiei-a a escrever sobre este estado de graça e o resultado não poderia ter sido melhor.

Do estado de graça ao estado de alarme

“A mãe é que sabe” propôs-me escrever. Não hesitei! Gosto de o fazer, mas atenção, esta mãe ainda não sabe nada! Estou na chamada primeira viagem e ainda me falta sentir o cheiro da minha menina (pirosa já estou! Melhor só o pai que lhe chama “a minh'Alice”). Sinto-a e vejo-a. E sinto cada vez mais porque soluça muito e porque deve fazer coreografias dentro de mim! Vejo-a cada vez mais porque ando a fazer ecos semanais. Já a vi num sonho e num pesadelo. Também sonham com isso? Já a vi morena linda e já a vi tipo lobisomem cheia de pêlos (é que nem a dormir a paixão e o medo se largam). Mas falta-me o cheiro! O cheiro maravilhoso a bebé que deve superar tudo quando o bebé é nosso. Só quando a sentir nos braços e me preencher os cinco sentidos começarei a tornar-me "uma mãe que sabe". Por agora, sei que passei de um estado de graça a um estado de alarme. Sei que a gravidez é este turbilhão entre a paixão e o medo. A paixão por passarmos a sentir dois corações dentro de nós... Por passarmos para um lado transcendente e tomarmos consciência do nosso super-poder.

Depois, a paixão que se reacende com o pai e a compaixão por quem nos rodeia e mima! Não sei se é assim noutro lugar, mas os portugueses sorriem para as grávidas (exceto nas filas do supermercado). Durante os nove meses não há quem nos queira mal, mas há um estado de alarme! Começa quando as análises confirmam a gravidez e esperas três meses até anunciar. Porquê? Nunca pensei fazê-lo, mas decidi guardar segredo. Um medo que se intensifica a cada ecografia. Na véspera não se dorme bem e antes de entrar respira-se fundo. Depois, vamos sorrindo devagarinho a cada boa notícia mas só no final soltamos o grito.

Chega a preparação para a parentalidade (só nomes pomposos). Vale muito a pena, mas acciona o estado de alarme! “Já têm pediatra?” “Já sabem onde vão ter a criança?” “Creche ou avós?” (Bolas, será que já deveria estar a tratar disto às 26 semanas?) E o doudout? (um boneco para dormir) “Se dormirem já com ele terá o vosso cheiro e acalmará a criança!” (Raios, não estava a pensar comprar nada disto e já temos o boneco na cama e duas chuchas na gaveta). E quando rebentarem as águas, se for transparente podem tomar banho e comer, se for verde não demorem tanto e sigam para hospital, e blá blá blá. E eu que sou calma e descontraída começo a acusar a pressão!  “Não posso esquecer disto!" “Ai não tenho camisas!” “Ai 'bora lá ver da creche.” “Recapitulando, se for verde... Errr!” Mas depois respiramos, descarregamos no pai e voltamos à normalidade, nunca total.

E não termina aqui! O estado de alerta vermelho dá-se lá para o último trimestre. “Aí tenho uma dor.” “Aí não, é bexiga cheia.” “Ui estou a ter uma contração.” “Vê lá o que achas?” “Não me parece, a barriga não está toda rija.” Diz o pai. “Olha agora é mesmo!” “Sim, agora é!” “Mas hoje já tive uma.” “Mas foi há uma hora.” “Olha outra. Espera. Desta vez é uma cólica.” “Será que isto é mesmo a miúda a mexer?” Entretanto já fez uma coreografia e põe-me também a saltar cada vez que mexe, mas pelo sim pelo não pedimos ao pai que coloque a mão para confirmar. “Estarei com falta de ar?” “Não, é ela que já ocupa espaço.”

Pode não parecer mas a paixão aumenta muito mais do que o medo. E o medo já é fruto da paixão. É o nosso estado de graça que nos coloca em alarme, porque o amor é tanto e não queremos que os nossos poderes especiais falhem. Não é, mães que sabem? 



 
 Célia Alves, grávida de 35 semanas e 6 dias
Blogue O meu coração de criança
(acabadinho de nascer)


Afinal havia outra é a nova rubrica do A Mãe é que sabe, escrita por outras mães que não as Joanas. Podíamos dizer, qual candidata a Miss Mundo, que queremos dar voz a outras mães mas no fundo, no fundo, o blogue está a correr tão bem que já nos podemos dar ao luxo de ter escravas a trabalhar por nós.